Diferente de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) não quer mais ser presidente da República. Enquanto Lula volta e meia brande sua candidatura como uma ameaça à oposição e à Lava-Jato, FHC parece resignado com a idade provecta e seus dois mandatos.
Isso não faz do tucano um ex-político. Mas, ao despir-se da vaidade de retornar ao poder, fica mais à vontade para esgrimir sua retórica.
“É sempre muito difícil pedir austeridade. É preciso dizer para quê austeridade”, aconselhou ele dirigindo-se ao presidente Michel Temer (PMDB). Como se sabe, o atual mandatário manipula remédio amargo para a já amarga vida do brasileiro.
Prossegue FHC sugerindo que Temer “fale, explique, convença”. O esforço da comunicação é deixar claro que o Brasil vive um momento de “ruptura” na condução da economia.
O ex-presidente entende que a sociedade ainda não sabe que existe uma nova agenda. Se os economistas e o governo já sabem o que fazer, “a sociedade ainda não prestou muita atenção por que faltou o elo político, que significa falar, explicar”.
O sucesso ou o fracasso do mandato-tampão de Temer depende, assim, de qual “narrativa” sairá vitoriosa. Se a necessidade de reformas austeras ou a agenda que prevaleceu nos últimos 13 anos. “Estamos num momento crucial” se quisermos mudar a “percepção das coisas”, adverte o tucano-mor.
Temer não tem votos
Temer tem a legitimidade do rito constitucional que delega ao Legislativo e à Suprema Corte o condão de remover um presidente que comete crimes e dar posse ao vice. Os votos, lastro que emana das ruas, estes ele não tem.
Ao assumir o poder presidencial, Temer não se limitou às promessas de debelar as mazelas percebidas a olhos nus pelos eleitores. Carestia e desemprego pespegam o brasileiro. Juntas geram aflição e pessimismo.
À tarefa precípua, reverter o rombo fiscal deixado pela antecessora, Temer acrescentou outras. Quer reformar a previdência, ampliar as concessões públicas e retalhar a legislação trabalhista. No telefone sem fio da comunicação, Temer quer cortar benefícios e criar tarifas.
Na boca da oposição ficaria assim: o sistema anterior, por distribuir direitos, não presta. A matriz proposta, que prevê corte de benefícios, é a única solução. Difícil explicar. Mais difícil convencer.
Ou seja, se tinha uma missão espinhosa tem agora uma missão quase impossível. Não fará nada sem tremendo apoio. Apoio partidário, empresarial, sindical e popular.
Daí o conselho de FHC. Semelhante ao do jornalista Antonio Machado, colunista do Correio Braziliense. Divulgar seu governo é “missão indelegável”, resumiu o periodista.
A difícil tarefa de convencer
Numa visão metafórica, o Brasil se assemelha a um paciente a quem só resta como alternativa o remédio com fortes efeitos colaterais. Somente uma intervenção dolorida agora levará a economia a um crescimento sustentável no futuro, prega o governo.
Próceres do PMDB fazem isso sem a prévia explanação do médico que alerta o paciente sobre a gravidade de seu estado, e não resta alternativa senão uma droga pesada e cara. É ele, Temer, o médico que terá que convencer os pacientes, ou os eleitores, de que o quadro clínico brasileiro não lhe deixa outra saída.
Nesse cenário recessivo inédito, um presidente impopular e sem votos terá que convencer cidadãos impacientes que é necessário mais sofrimento antes de sair do atoleiro. Até aqui, das ações de comunicação transpareceu que a intenção do Governo é reduzir direitos da maioria menos favorecida.
Nada mais difícil de engolir para quem se acostumou com distribuição de renda, moradia subsidiada, bolsa de estudo, bolsa-família, viajar de avião e crédito a mancheias, afora emprego farto. Certo, assim, que Temer meteu-se numa empreitada para lá de difícil.