O que falta para a deposição de Dilma


Integrantes dos três poderes da República, jornalistas e lobistas de Brasília, em incontáveis parolagens, têm uma certeza e uma dúvida. A presidente Dilma Rousseff não consegue tirar o país da crise econômica e política que paralisa o Brasil.

Ao mesmo tempo, não há consenso sobre qual a melhor solução legalista para demovê-la do cargo e, com isto, buscar apressar o fim da agonia cívica que vivenciamos. A intensidade do desassossego redundará no desfecho da crise – seja o afastamento ou a resignação.

Hoje, a presidente está a um passo do cadafalso. Boa parte desses degraus foi escalada por ela mesma, consequência de seu voluntarismo, do desprezo pelo contraditório, do jeito atrabiliário com os demais viventes e da má gestão.

Foi o caso da política monetária. Ela decidiu achatar a taxa básica de juros, a Selic. Não deu certo. Hoje, a brasileira voltou a figurar entre as maiores taxas do mundo.

Com uma canetada, a atual mandatária rebaixou o custo de energia, a “conta de luz”. Em seguida, assistiu, impotente, a “conta” retornar ao cume que aflige trabalhadores e empresários.

No caso dos combustíveis, manteve a política de preços do antecessor. Destravadas as amarras que seguravam este e outros reajustes, súbitas elevações de tarifas administradas estufaram a inflação.

Nestes e noutros casos, ela ignorou advertências de assessores. Ao desdenhar de objeções, fugiu de admoestações pertinentes.

Para evitar a razia, Dilma precisa de maioria parlamentar, que lhe é negada agora até mesmo pelo PT, sua sigla. Afinal, desde o começo do mandato, em 2011, ela desprezou o Congresso Nacional.

Já no primeiro mandato, colecionava ressentimentos entre aliados por sua posição inexpugnável, entrincheirada no Palácio do Planalto. Poucos eram os que privavam da convivência da presidente – destoando dos antecessores, FHC e Lula, hábeis negociadores.

Reeleita em 2014, contradisse uma a uma as juras de campanha. Sob a tutela do marqueteiro João Santana, alcançado agora pela operação Lava-Jato, a mandatária elevou ao paroxismo o pragmatismo cínico das campanhas eleitorais.

Seu governo afundou o país no que pode ser a recessão nunca antes vista na história do Brasil. Mais deletério do que a inflação descontrolada, os juros esbulhadores e o desemprego angustiante é a asfixiante falta de perspectiva.

Como sinal incontroverso de que a campanha foi apenas para eleitor votar, Dilma apressou-se em nomear o ultraliberal Joaquim Levy para o comando da economia. Infenso ao pensamento econômico petista e sem lastro presidencial, Levy caiu.

A nova aposta é o desenvolvimentista Nelson Barbosa, um dos artífices da política econômica petista, como desvelou o Valor Econômico. Com ele, a mandatária planeja aprovar a volta da CPMF e a reforma da Previdência Social.

As iniciativas são obras de engenharia política hercúleas mesmo que ela tivesse a expertise política de seus dois antecessores e nadasse em popularidade. Não tem nem uma nem a outra.

Em suma, na administração pública falta gestão; na política, habilidade; e na economia, rumo.

Dilma: impeachment ou cassação

Entre as alternativas mais plausíveis para demover a presidente do Planalto, duas se destacam: pelo impeachment ou por sentença da Justiça Eleitoral. No primeiro caso, cai Dilma Rousseff e o vice-presidente assume. No segundo, deixam o poder ela e seu vice, Michel Temer; a sucessão é decidida em novo pleito, dentro de 90 dias.

Diante do cenário premente, os pedidos para cassação da chapa Dilma-Temer correm no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com vezeira lentidão. Há ritos a seguir, defesas a ouvir, provas a anexar, juízes a trocar de cadeiras, recursos a impetrar, vistas a pedir.

O impeachment, já abordado no Blog da Política Brasileira, depende de outros fatores, que podem ser cotejados com a deposição de 1992. Numa primeira comparação, o isolamento de Dilma aproxima-se do de Fernando Collor. É o que indicam os copiosos índices da rejeição ao mandato presidencial.

Nas cortes superiores, TSE e STF (Supremo Tribunal Federal), uma segunda incógnita. O ativismo jurídico dos magistrados destoa do papel restrito adotado pelos mesmos tribunais em 1992. A decisão do Supremo, em dezembro último, intervindo em ritos interna corporis do Legislativo, é inédita e contestável.

As manifestações do próximo dia 13 de março, o terceiro aspecto, indicarão o termômetro de (in)tolerância à presidente. Não apenas o volume de figurantes, mas o figurino dos manifestantes. Pregações difusas, em favor do golpe militar e tarifas de transportes zeradas, debilitarão o eixo dos protestos.

Uma quarta diferença recai sobre quem ocupará a principal sala do terceiro andar do Planalto em caso de vacância. Michel Temer derrapou, mas não se inviabilizou, com sua missiva à presidente em dezembro de 2015.

Como contraponto, Itamar Franco, o vice de Collor, manteve-se discreto e afastado de qualquer conspiração. Além disso, não havia, como hoje, o receio da anulação da chapa que vencera as eleições em 1989.

Como quinto obstáculo o deputado Eduardo Cunha, réu da Lava-Jato na Suprema Corte. Presidente da Câmara, caberia a ele presidir o processo de impeachment. Caso a justiça destrone a chapa Dilma-Temer, Cunha presidiria o Brasil por 90 dias.

A Lava-Jato, górgone que maneteia ainda mais as ações do governo, converte-se na sexta e derradeira assimetria. Inescrutável, a operação que esquadrinha o milionário escoadouro de dinheiros do erário funciona como um patíbulo fantasmagórico que engole, às vezes sem aviso, os malfeitores da República.

Sobre o cambaleante mandato de Dilma adejam um marqueteiro, um senador e um punhado de empreiteiros, fustigados pela Lava-Jato. Endinheirados, mas enjaulados. Como quase todo mortal, sequiosos pela liberdade. Mesmo que ela custe uma traição.

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