O Brasil toma um café com Proust


O Brasil decide agendar um encontro, sentar-se e conversar com o escritor francês Marcel Proust, autor de “Em Busca do Tempo Perdido”, que trata, entre outras coisas, sobre memória, autoavaliação, dor e prazer. O motivo desse interesse é desconhecido, mas tratando-se de Brasil as razões podem ser múltiplas ou nenhuma. De um jeito que as vezes se mostra simpático e outras ausente, Proust conversar com o Brasil que, para seu gosto, possui pouquíssimas qualidades que o impressiona.

O diálogo se inicia da forma mais prosaica possível. O escritor logo percebe estava sentado em frente a uma criança mimada. Mais tarde, ao comentar o encontro com um amigo, Proust diz que se trata de alguém que se considera mártir de uma tragédia auto inflingida.

Enquanto o pequeno grande Brasil narrava seus infortúnios e como o (auto) boicote o impediu de assumir as grandezas que lhes foram reservadas, Proust respondia de forma desapaixonada que sentir dor é a única forma de adquirir conhecimento e sabedoria.

A conversa seguiu ritmos paralelos. O Brasil não prestava atenção em suas próprias frases e queixava-se do seu povo, que necessitava de uma motivação extraordinária para executar o ordinário e de seus governantes, uma tragédia, apesar de serem eleitos pelos próprios cidadãos. Depois de ouvi-lo, Proust diz: “A dor ajuda a pensar e a colocar as ideias em contexto”, e prossegue: “Existem apenas dois métodos de conseguir conhecimento e sabedoria: sem dor, por meio de professores e bom exemplos; ou com dor, por meio da própria vida.”

Segundo relatos de pessoas que observavam o diálogo a distância, esse foi um dos poucos momentos em que o Brasil demonstrou atenção ao que estava sendo dito. Possivelmente isso relacionou-se com a frase e com sua condição de tentar, sem dor, aprender apenas com a vida. Deve ter pensado naquele momento que educação nunca foi sua preferência, e lembrou de inúmeros rostos que buscavam ensinar o povo, como divindades, não via conhecimento, e sim justificando que tudo que aprendera fora apenas com a vida e com altas doses de sorte.

“A sorte não pode ser considerada uma constante. Quanto menos precisamos dela, melhor estamos indo”, disse o francês.

O Brasil sabia que ancorava-se no que de mais frágil existia. A sorte compensava a desorganização, a inércia, a corrupção e o progresso. O mantra “Deus é brasileiro” era o corrimão que precisava para navegar fora da rota daqueles que chegaram aonde queriam chegar.

De forma eloquente e sensata, o Brasil resolveu fazer uma pergunta mais direta: “O que preciso fazer para me tornar o país que poderia ser?”

O tempo no qual Proust pensou para responder foi quase equivalente ao tamanho da angústia daquele país tropical que não perde uma oportunidade de perder uma boa oportunidade. Enquanto o silêncio dominava aqueles segundos, Proust pensou:

“Quando se sacrifica a realidade em detrimento de algo que não existe ou funciona, corremos o risco de viver nessa fantasia na qual somos grandes, poderosos, invencíveis, sortudos e tantas outras coisas. A realidade é exposta pela dor e a imaginação por meio dos grandes prazeres, sucessos, fórmulas fantásticas e soluções radicalizantes. Enquanto o Brasil e seus governantes alimentarem a fantasia do direito divino à grandiosidade, os brasileiros buscarão apego em contadores de histórias e não em planejadores do futuro, tal como ocorreu nesses últimos anos.”

Preferiu não expor seu pensamento e permaneceu em silêncio: “você mesmo sabe a resposta”, respondeu Proust segurando sua xícara de chá, claramente desinteressado.

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