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Abertura comercial ampla deveria ser precedida de redução do Custo Brasil, defende representante do setor calçadista

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Apesar dos esforços do Ministério da Economia em negociar uma abertura comercial ampla, a indústria brasileira tem reagido com contrariedade à proposta. Para o setor, a abertura planejada pelo governo está sendo feita de forma desordenada e pode gerar uma competição desleal com produtos produzidos em países asiáticos. A consequência, argumentam, seria o aumento do desemprego.

“O custo do trabalho no Brasil é muito maior do que no Vietnam e na Indonésia. Temos toda uma questão de precarização do trabalho na Ásia. Lá não se cumpre a mesma legislação que o Brasil cumpre. Mas estamos competindo com esses países”, explica o presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira.

Atualmente o Brasil negocia com os países do Mercosul a redução da Tarifa Externa Comum (TEC), um mecanismo de proteção da indústria local e de integração regional. A ideia defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, é uma de redução homogênea de 20% para todos os itens, intercalada em duas etapas de 10%. A decisão ainda está pendente, principalmente porque não houve concordância da Argentina. As regras do Mercosul definem que decisões desse tipo precisam ser tomadas em consenso entre todos os países.

A fala de Haroldo está em consonância ao que defende, por exemplo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI). Segundo a entidade, antes de realizar uma abertura comercial ampla o Brasil precisaria “acabar com o pesadelo tributário a que nossas indústrias são submetidas diariamente”.

Confira a entrevista* completa, com Haroldo Ferreira, presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados)


A Abicalçados tem se posicionado contra a abertura comercial. Porque?

Nós somos contra uma abertura comercial com determinados países contra os quais o Brasil leva muita desvantagem. Somos a favor da abertura através de acordos comerciais, não por uma redução da Tarifa Externa Comum (TEC), proposta pelo Brasil na reunião do Mercosul. Esse corte de 10% na TEC nós somos contrários. Haverá concorrência desleal de outros países, principalmente asiáticos.

Somos favoráveis à abertura comercial através de acordos comerciais, como o acordo do Mercosul com a União Europeia, que ainda não está implementado, mas precisa ser o quanto antes. Também precisamos fazer acordos com os Estados Unidos, com Canadá, Reino Unido… Mas para simplesmente reduzir a TEC, nós precisaríamos ter feito a tarefa de casa, que é reduzir o Custo Brasil.

Uma redução das tarifas de importação não beneficiaria o consumidor?

O problema é que as indústrias nacionais serão afetadas com uma redução do imposto de importação. Vai haver um desmonte da indústria calçadista nacional, que hoje emprega mais de 350 mil trabalhadores. Um aumento do número de desempregados com certeza não seria benéfico para o país.

Quando o país for competitivo, pode-se reduzir imposto de importação e essa redução poderá beneficiar o consumidor, como todas as outras mudanças que precisam ser feitas no país.

A pandemia é um fator importante para definir esse posicionamento da indústria?

O momento da pandemia piorou a situação da indústria como um todo por conta da diminuição do consumo. Mas se não tivesse acontecido a covid, nosso posicionamento seria o mesmo. Nosso ponto é garantir as condições de equidade para competir com outras regiões do planeta, principalmente a Ásia, os países têm vantagens competitivas. O custo do trabalho no Brasil é muito maior do que no Vietnam e na Indonésia. Não é um problema do Brasil. No Brasil nós até temos que melhorar a remuneração do trabalhador. O que está errado é lá. Temos toda uma questão de precarização do trabalho na Ásia. Lá não se cumpre a mesma legislação que o Brasil cumpre. Mas estamos competindo com esses países.

Se pegarmos as convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Vietnam ratificou 13%, Indonésia 11%, o Brasil 52%. São vários tratados em vários assuntos que diminuem nossa competitividade. Nós não queremos migrar nossa indústria para a Ásia.

Antes de diminuir imposto de importação, temos que resolver o custo Brasil.

O que podemos fazer para reduzir o custo Brasil?

Nós fizemos uma reforma previdenciária que vai ser suficiente por um período, mas que daqui alguns anos vamos ter que fazer uma nova reforma. Nós estamos trabalhando na reforma tributária. Sabemos que estamos em um ano pré-eleitoral e vai ser muito difícil que a gente consiga fazer uma reforma tributária ampla. Porém, se não fizermos nada de reforma tributária neste momento, e nessa atual conjuntura, o país vai ficar menos competitivo. Tem a questão da infraestrutura, com investimentos e marcos regulatórios como a BR do Mar.

Mas uma coisa é aprovar uma legislação sobre um determinado item, outra coisa é o impacto real. Uma medida é aprovada – regulamentação do gás, por exemplo. Quando vai baixar o preço do gás na indústria? Enquanto a regulamentação não for transferida para o custo da indústria, não haverá redução do Custo Brasil, mas sim uma expectativa de redução do custo Brasil. E, às vezes, o governo, quando diz que reduziu o custo Brasil, ele está falando sobre a expectativa de redução. Temos um observatório sendo montado em parceria com a Coalizão Indústria, Movimento Brasil Competitivo (MBC) e Fundação Getúlio Vargas (FGV) para monitorar e demonstrar o que realmente está acontecendo no Custo Brasil.


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