Sob forte pressão de empresários, maioria na Câmara é a favor da derrubada do veto de Bolsonaro, mostra pesquisa da Arko Advice
O veto de Bolsonaro à prorrogação da desoneração da folha de pagamentos gerou forte reação no setor empresarial que pode ser atingido pela medida. Os donos de empresa temem que o fim do benefício possa levar a um crescimento no desemprego, por vir imediatamente após o período de pandemia do novo coronavírus.
A prorrogação do prazo foi proposta como parte da MP 936, que previa que o benefício, em vez de ter fim no final de 2020, valesse até o final de 2021. Ao ser sancionado pelo presidente, o projeto teve trecho retirado. Depois disso, mais de 30 entidades relacionadas a setores da indústria e do serviço enviaram ao Congresso um ofício pedindo a derrubada do veto presidencial.
“O adiamento é medida imprescindível à preservação de estruturas produtivas que abrangem cerca de 6 milhões de empregos formais diretos, aos quais se somam milhões de postos de trabalho em suas redes de produção”, diz o documento.
Entre a lista de entidades contrárias ao veto está a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) e a Associação Nacional dos Jornais (ANJ). Para o presidente da entidade que representa os veículos de imprensa, Marcelo Rech, o fim da desoneração poderia gerar um “blackout de informação” no interior do país. “Com a crise, neste ano, cerca de 30 jornais já fecharam. Sem a desoneração, o número pode disparar no ano que vem. A manutenção dos veículos de imprensa no interior do país é essencial para o combate à desinformação”, defende.
Novo imposto
De acordo com o governo, os gastos que seriam necessários para a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos, não estão previstos no orçamento para o ano que vem. Deputados governistas argumentam que a Emenda Constitucional 106/2020 só permite abrir mão de impostos sem apontar corte de gastos em outra área se a mudança ocorrer dentro do período da calamidade pública pela pandemia de covid-19, que acaba em dezembro. Por isso, na visão do governo, a prorrogação para o ano que vem sem indicar uma contrapartida para os cofres do governo poderia furar o tetos de gastos e incidir em crime de responsabilidade fiscal.
“O governo não é contra desonerar esses 17 setores, mas a PEC que nós aprovamos torna essa prorrogação inconstitucional. Esse conjunto da desoneração obrigatoriamente precisa ser tratado dentro do reforma tributária para que a gente arrume uma forma de atender essa situação dentro das duas PECs em discussão no Congresso”, argumentou o deputado Arthur Lira (PP – AL) em live promovida pela BTG Pactual nesta quarta-feira (22).
Por outro lado, há o entendimento que a estratégia do governo com o veto é fazer com que a reforma tributária seja avaliada mais rapidamente no Congresso. “É um risco político a gente tratar de vetos, quando a gente deveria estar focando nossas forças em resolver a questão dentro da tributária antes de dezembro, já que o governo pensa em uma desoneração permanente”, defende Lira.
A questão que incomoda economistas e parlamentares é que a aprovação da desoneração no âmbito da reforma tributária estaria vinculada a criação de um novo imposto sobre transações eletrônicas, apelidado de “nova CPMF”. Mas para Lira, a nova cobrança é essencial para a desoneração. “Você não pode desonerar R$ 400 bilhões sem dizer de onde vem o dinheiro”.
A lógica é rebatida pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que defendeu o corte de despesas para custear a desoneração “A gente não deve transferir para a sociedade essa responsabilidade. A responsabilidade de você gerar uma desoneração, do meu ponto de vista, tem que ser financiada com a redução das despesas do governo federal”, defendeu.
Uma pesquisa da consultoria Arko Advice mostra que o governo vai ter muito trabalho se quiser manter o veto, já que a maioria dos parlamentares já se posicionou a favor de reverter a decisão de Bolsonaro.
O cientista político e presidente da Arko Advice Murillo de Aragão, que também participou da live, concordou que a relação entre o novo impostos e a antiga CPMF dificulta a discussão do assunto, mas acredita que a aprovação da desoneração deva ocorrer juntamente com a discussão de uma contrapartida. “A gente não pode confundir a CPMF com um imposto sobre a transações eletrônicas. Ele visa o e-commerce e todas as atividades digitais que crescem no país. Isso não quer dizer que seja uma CPMF. Apesar do legislativo ter uma posição forte contra aumento de impostos, há uma preocupação firme sobre responsabilidade fiscal. Há um amadurecimento institucional evidente dentro do debate. Então acredito que será encontrada uma solução, o que não será fácil”, defende.