Um dos grandes nomes do futebol italiano e mundial, o técnico Arrigo Sacchi viu uma frase sua ganhar todos os continentes há alguns anos. O treinador disse que “O futebol é a coisa mais importante dentre as coisas menos importantes da vida”. A afirmação nunca fez tanto sentido no futebol brasileiro como agora. A CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas, que vem apurando irregularidades no futebol brasileiro, surgiu de uma provocação de John Textor, dono da SAF do Botafogo, que acabou colocando em xeque a arbitragem brasileira, além de interesses de apostadores. A polêmica chegou até a CBF, na mira dos senadores. Mas a entidade máxima do futebol brasileiro tem uma chance de ouro: usar todo esse processo para reformatar a arbitragem no Brasil.
A CBF pode continuar fazendo bico e tentar desmerecer as denúncias de John Textor. Vai ter trabalho. Os senadores podem até não acreditar em tudo que o dirigente do Botafogo falou. Mas vão apurar tudo e o assunto seguirá na mídia, inclusive deixando a arbitragem brasileira no foco das polêmicas. Eduardo Gussem, Oficial de Integridade da entidade, sentiu o peso dos senadores esta semana, quando suas frases pareciam desmerecer Textor em depoimento na CPI.
– O CEO do Botafogo formalizou os fatos às autoridades. E as autoridades, a partir dali, começam a adotar as medidas legais cabíveis. A decisão final da validade disso vai ser sempre das autoridades públicas. Nesse aspecto específico, o CEO do Botafogo, o noticiante, não é o dono da bola. São as autoridades públicas que vão definir os rumos dessa investigação – disse ele.
CPI disposta a apurar irregularidades
Pouco depois de terminar a frase, viu o senador Carlos Portinho (PL-RJ), integrante da CPI, dar o tom de como as investigações seguirão.
– Vimos Textor tentar encaminhar suas denúncias para a CBF. Os indícios que ele trouxe chamaram muita a nossa atenção e deveriam ter chamado a atenção da CBF para recebê-lo. Textor até poderia ter enviado um e-mail para a CBF. Mas John Textor é o Botafogo, e o Botafogo é da família futebol. Se ele tem alguma denúncia, ele deveria ser recebido com tapete vermelho – disse Portinho, que lembrou ao senador que a CBF deveria levar isso muito a sério: “Temos linha de VAR de impedimento alterada, linha torta, temos um caso sério do que é visto pelo VAR e pelo árbitro, que está incongruente, e temos as questões de comportamento atípico de atleta, de muitos atletas no mesmo lance, que deveriam ser levadas a sério pela CBF”.
Outro membro da CPI, Eduardo Girão (Novo-CE) também se manifestou dizendo que Textor está “ajudando o futebol brasileiro”. Recados claros não apenas a Eduardo Gussem, mas a toda a entidade. A CBF poderia aproveitar isso para reorganizar a forma como a arbitragem atua no país.
CBF pode fazer mais pela arbitragem
O momento pede que a CBF promova uma conciliação com os clubes quando o assunto é arbitragem. Apesar de protagonista neste caso, o Botafogo não é o único a reclamar. Na primeiro rodada do Campeonato Brasileiro Adson Batista, presidente do Atlético-GO, disse que seu time foi roubado na derrota de 2 a 1 para o Flamengo. No último fim de semana o técnico do Grêmio, Renato Gaúcho, retirou seus jogadores do banco porque Jailson Macedo Freitas, presidente da Comissão de arbitragem da Federação Baiana de Futebol, teria avisado ao quarto árbitro que o atacante Diego Costa, deveria ser expulso. Fato que acabou acontecendo, ninguém sabe se por conta do alerta. O Bahia venceu o Grêmio por 1 a 0. Mas o resultado ficou em segundo plano.
A atitude de Renato Gaúcho ganhou a mídia e fez a Associação Nacional de Árbitros (ANAF) pedir a anulação do jogo por interferência externa e o banimento de Jailson. Por falar na ANAF, ela e a Associação de Árbitros de Futebol do Brasil (Abrafut) disputam para ver quem fala pela arbitragem no Brasil. Um claro sinal de que é preciso mudar porque ninguém se entende. E a CBF precisa liderar essa mudança.
Mudança passa pela arbitragem mais organizada
A mudança passa pela conciliação com os clubes, o que já exige, de cara, desmontar a atual Comissão Nacional de Árbitros, liderada por um Wilson Seneme cada vez mais fragilizado pela incompetência do setor. Seu trabalho é um reflexo do fracasso. Não é possível mais insistir com ele sob a pena de a CBF desmoronar.
O retorno do sorteio para definir a arbitragem dos jogos é uma possibilidade para alguns, principalmente com uma auditoria externa. Inclusive passou do momento de se trabalhar na profissionalização dos árbitros, mesmo que ela seja feita com um período de transição. Os árbitros poderiam ser exclusivos e submetidos a regras de compliance.
Se a CBF não conseguir liderar esse processo, que entregue de vez o comando do futebol brasileiro aos clubes pois a entidade tem prestado há alguns anos um péssimo serviço quando o assunto é o maior espetáculo de entretenimento para os brasileiros: o futebol. Que a CPI no Senado ajude.