O ex-presidente Jair Bolsonaro deve perder apoio com as investigações da Polícia Federal (PF) sobre espionagem ilegal da Agência Brasileira de Inteligência, episódio conhecido como Abin paralela. O advogado, cientista político e CEO da Arko Advice, Murillo de Aragão, avaliou a repercussão do caso como negativa para o bolsonarismo em participação no programa WW, da CNN, nessa segunda-feira (29).
— Eu acho que Bolsonaro fica machucado por esse episódio todo, ainda que, por outro lado, reforce o discurso de vítima, já que as batidas, como ele disse ‘estão querendo me esculachar’. Isso serve para justificar uma pretensa perseguição política — pontuou Murillo.
Quanto à possibilidade da existência de fato da Abin paralela, Murillo de Aragão se mostrou cético.
— Essa rede de informação, se existir, era profundamente incompetente. Ela poderia ter identificado que, da forma que ele fez a campanha, ele iria perder a eleição. Então eu não vejo que isso tenha funcionado de forma efetivamente profissional. Agora, se existiu, e pelas evidências que aparecem, é uma vergonha, é um escândalo o uso de um organismo público de informação a favor de interesses particulares — explicou Aragão.
Entenda o imbróglio
Nessa segunda-feira (29), o filho do ex-presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), foi alvo de uma operação de busca e apreensão.
Segundo as investigações, assessores de Carlos Bolsonaro teriam pedido informações para o ex-diretor da Abin, atualmente deputado federal, Alexandre Ramagem (PL-RJ). Em operação na semana passada, os agentes encontraram documentos sigilosos impressos em posse de Ramagem. Além dele, os assessores de Carlos também foram alvo de operações da PF.
Eleição municipal no RJ
Alexandre Ramagem, um dos indicados como integrantes da Abin parelela, é pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro pelo PL, com apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para disputar o pleito. Também na cidade do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro irá disputar reeleição para vereador e participa como um dos coordenadores da campanha de Ramagem à prefeitura.
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Lula e Bolsonaro
Como resposta às investigações, Jair Bolsonaro declarou à CNN que a operação contra seu filho se trata de perseguição política.
— Eles querem me associar a essa ‘Abin paralela’, mas não vão encontrar nada. É uma pesca em piscina. Não vão tirar um peixe. Estou sendo perseguido pelo governo do Lula.
Por sua vez, o presidente Lula classificou a declaração de Bolsonaro de “grande asneira”. Em entrevista à rádio CBN Recife, nesta terça-feira (30), o petista afirmou que irá esperar o desfecho das negociações antes de tomar uma decisão quanto à permanência de Alessandro Moretti, diretor-adjunto da agência, que está sob investigação de cooperar com Ramagem após a sua saída da Abin.
— A gente nunca está seguro — comentou Lula. — Se isso for verdade, isso está sendo provado, não há clima para esse cidadão continuar na polícia.
Bebianno indicava Abin paralela
Em 2020, no programa Roda Viva, o ex-ministro de Bolsonaro, Gustavo Bebianno, afirmou que Carlos Bolsonaro tinha várias ideias e chegou a apresentar nomes de policiais para criar uma Abin paralela.
— Um belo dia, o Carlos me aparece com o nome de um delegado federal e de 3 agentes, que seriam uma espécie de Abin paralela, porque ele não confiava na Abin — explicou Bebianno.
Reunião ministerial e Abin paralela
Também em 2020, o ex-presidente Bolsonaro disse, durante uma reunião ministerial, que tinha um sistema de inteligência “particular”, sem apresentar detalhes. Na época, ele criticou o sistema de inteligência brasileiro, em referência à Abin e à PF.
— O meu particular funciona. Os que tem oficialmente, desinforma. E voltando ao tema: prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho — enfatizou Bolsonaro.
No entanto, as investigações da PF ainda não apresentaram indícios de que o ex-presidente Jair Bolsonaro participaria do núcleo político da suposta Abin paralela.