Divulgada, na última terça-feira, 8, a sentença do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF) — decidindo liminarmente que a escolha da comissão especial do impedimento da presidente Dilma Rousseff deveria ser por voto aberto —, veio à baila a interpretação mais óbvia. Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, perdera. Afinal, ele atropelara o plenário da Câmara Baixa para, numa votação célere, derrotar o Palácio do Planalto ao formar uma maioria oposicionista naquela comissão, doravante vital.
Essa interpretação foi teatralizada pela deputada governista Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que posou exultante para as câmeras de TV. Ou seja, Cunha bancou o voto secreto; o STF suspendeu provisoriamente a decisão; logo a situação venceu. Será?
As ações na política equivalem aos lances num tabuleiro de xadrez; o enxadrista vencedor é aquele que está disposto a sacrificar uma peça para capturar do adversário uma de maior valor duas, três jogadas à frente. Cunha, por óbvio, acelerou a votação secreta mesmo sabendo que o STF poderia anular a decisão do plenário. É crível que um parlamentar ardiloso como Cunha se precipitaria num aparente açodamento?
A resposta está noutra pergunta: quem perdeu? A decisão do STF implicou a paralisação do processo na Câmara. A comissão especial, que começaria a funcionar na próxima semana, agora não tem data para sua reunião inaugural. O Supremo decidirá a procedência da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), do PCdoB, somente na próxima quarta, 16. Sessões complexas e rumorosas costumam estender-se até à noite. Dessa forma, caso o STF decida por anular em definitivo a votação secreta, restará a Cunha convocar uma nova, desta vez aberta. Na dinâmica do Legislativo esse novo escrutínio ocorrerá na semana seguinte, que, por força de dispositivo constitucional, terá apenas dois dias: segunda, 21, e terça, 22. Depois disso virá o recesso parlamentar – que se encerrará em 1º de fevereiro de 2016.
A vitória de Pirro do governo completar-se-á caso, numa eventual nova votação, o resultado da sessão da última terça, 8, repetir-se e os oposicionistas conquistarem, no voto aberto, maioria na comissão especial que julgará o impeachment de Dilma Rousseff. Se o STF referendar o voto secreto, o regozijo do presidente da Câmara será completo. Revés ainda maior é a hipótese do adiamento da decisão dos magistrados. Basta, para isso, que um ministro requeira vista do processo.
Cunha, com adversários espalhados pela Esplanada dos Ministérios, deverá ser barrado em algum momento. Até lá, no entanto, o caviloso deputado continuará valendo-se de ardis regimentais para, embaralhando os ritos processuais, procrastinar os destinos dele e da presidente da República.