Sem consenso, o projeto de lei de combate às Fake News está travado na Câmara dos Deputados. O texto, considerado polêmico entre os parlamentares, foi aprovado no dia 30 de junho pelo Senado Federal e foi entregue à Câmara no dia 3 de julho. Ou seja, o Projeto de Lei 2630/2020 está perto de completar aniversário de um mês na Câmara e ainda não há data para que a próxima etapa da tramitação possa ocorrer, já que não foi designado sequer o relator da matéria.
Para os parlamentares, o texto vindo do Senado precisa de muitas adaptações. Ao mesmo tempo que aliados do presidente Jair Bolsonaro dizem que o texto promove a censura e tentam derrubar o PL, a própria oposição defende que pontos do texto sejam analisados com mais calma.
“É um tema muito sensível. E estou convencido cada vez mais que temos que ter muita serenidade na construção desse texto”, destacou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), em discussão na Câmara dos Deputados.
A principal movimentação é para alterar o artigo 10 do projeto, que tenta aumentar a “rastreabilidade” de mensagens enviadas por aplicativos de mensagem. O dispositivo obriga que as companhias registrem e mantenham por três meses o histórico de mensagens encaminhadas em massa, ou seja, aquelas enviadas por mais de cinco pessoas e que tenham atingido pelo menos outras mil.
O objetivo seria possibilitar que investigações cheguem até os responsáveis começado a disseminação de determinado conteúdo. Mas, para especialistas, o mecanismo poderia permitir a perseguição de grupos com opiniões divergentes do governo.
“O problema é que a legislação estaria atuando em uma área cinzenta que exige muito juízo de valor. Primeiro, não há como definir com clareza o que é considerada uma fake news. Fake news é somente uma notícia que tem informações que não condizem com a verdade? Ou também pode ser uma notícia do passado divulgada no presente, um conteúdo produzido em um contexto histórico e divulgado em outro?”, explica o advogado Frank Ned, membro da comissão de direito digital da OAB-DF.
Em um debate na Câmara dos Deputados na última segunda-feira (27), a plataforma Whatsapp participou da discussão por meio do Diretor de Políticas Públicas do WhatsApp no Brasil, Dario Durigan. Para o representante da empresa, obrigar que os aplicativos guardem certas mensagens exigiria que, na prática, todas as mensagens fossem analisadas, violando a privacidade dos usuários. Segundo ele, a plataforma já combate as fake news permitindo o encaminhamento de mensagens somente para uma pessoa de cada vez.
O que diz o projeto?
O Projeto de Lei 2630/20, chamado oficialmente de “Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet”, é um dos mais de 50 PLs que tramitam no Congresso que tocam no tema das fake news. Além da rastreabilidade, o texto obriga as redes sociais, como Facebook e Twitter a excluírem contas falsas, que não representem pessoas reais. As redes também devem excluir os “bots”, os robôs que publicam e republicam conteúdos automaticamente, mecanismo muito usado para inflar ataques digitais.
Caso haja suspeita, a lei estabelece o procedimento para que as empresas validem a autenticidade do usuário: elas vão poder solicitar o envio de documento de identidade. A medida já é aplicada de forma semelhante na plataforma Twitter, que exige identidade para comprovar a maioridade do usuário.
Uma das regras também regula o uso das redes sociais por autoridades. Pelo texto, agentes políticos ficam proibidos de bloquearem outras contas, impedindo o acesso às publicações. A medida remete a episódios onde ministros e o próprio presidente Jair Bolsonaro bloquearam jornalistas no Twitter. No começo do mandato, o presidente bloqueou o acesso a suas publicações por membros do site jornalístico The Intercept Brasil, por exemplo.
Em outro trecho, a preocupação do projeto é na transparência da publicidade divulgada nas redes. Se a nova lei for aprovada, será obrigatório que conteúdos pagos venham com a identificação de quem é o responsável pelo material.