Bolsonaro demite Mandetta

Foto: Alan Santos/PR

O presidente da República, Jair Bolsonaro, anunciou a demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS). Sua permanência no cargo ficou insustentável após, no último domingo (12) em entrevista à TV Globo, desafiar publicamente Bolsonaro, o que desgastou Mandetta e foi visto no governo como um ato de “insubordinação”.

Um indício desse desgaste foi captado pela empresa Bites, que monitora as redes sociais. Até quarta-feira à noite (15), as menções de apoio a Mandetta no Twitter totalizavam 155 mil publicações, número bem abaixo das 600 mil menções registradas no dia 6 de abril, quando surgiu o primeiro rumor mais forte da demissão de Mandetta.

Mesmo que Luiz Henrique Mandetta saia do cargo com uma imagem positiva, a posição de quase unanimidade nacional que o agora ex-ministro chegou a ter no início do mês não é mais a mesma.

Ao “bater de frente” com Jair Bolsonaro, Mandetta acabou perdendo o apoio dos militares, que foram fundamentais para convencer Bolsonaro a não o demitir no início de abril, ficando ainda mais fragilizado.

Como o respeito à hierarquia é algo “muito caro” para os militares, o gesto de Mandetta, mesmo que politicamente justificável, é visto como uma suposta “insubordinação”. Aliás, não foi por acaso que na última terça-feira (14), o vice-presidente Hamilton Mourão fez uma analogia com o polo ao dizer que Mandetta “cruzou a linha da bola”.

As declarações de “afronta” feitas por Mandetta a Bolsonaro – dando sinais que o ex-ministro também estava atuando politicamente – assim como a escolha de Nelson Teich, que deve ser bem recebido pela comunidade médica, servem de anteparo ao presidente e minimiza o seu desgaste junto à opinião pública.

A escolha de Teich é vista internamente como uma vitória do secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten, e do empresário e dono da Tecnisa, Meyer Nigri, aliados de primeira hora de Bolsonaro na campanha eleitoral de 2018 e defensores de Teich.

Embora a demissão de Mandetta provoque um certo desgaste na imagem de Jair Bolsonaro, ele é bem menor se a troca no Ministério da Saúde tivesse ocorrido há algumas semanas.

Além disso, Mandetta e sua equipe já se pronunciaram publicamente no sentido que a troca de comando na pasta “não será brusca”, sinalizando que haverá diálogo e troca de informações entre as equipes.

Entretanto, há desafios para o novo ministro da Saúde, Nelson Teich, como, por exemplo, a gestão política da pasta. A coordenação das ações do Ministério com governadores e prefeitos serão fundamentais para o sucesso do novo comandante do Ministério da Saúde.

A mudança no Ministério da Saúde traz as seguintes consequências:

  • Ao escolher um médico, as críticas da comunidade médica – assim como da opinião pública – devem ser contidas no curto prazo;
  • Mesmo com Teich no lugar de Mandetta, a flexibilização do isolamento social não deve ocorrer de forma brusca. Além dos governadores estarem prorrogando as medidas restritivas, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que cabe aos estados e municípios determinar as medidas restritivas. Soma-se a isso o anúncio que os governadores Wilson Witzel (PSC-RJ) e Helder Barbalho (MDB-PA) contraíram a covid-19, aumentando a pressão em favor da manutenção do isolamento social;
  • O governo necessitará melhorar o diálogo com o Congresso Nacional, já que os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), são aliados e defendiam a manutenção de Mandetta no cargo;
  • Dependendo da nova condução do Ministério, poderá ocorrer embates com governadores e prefeitos, que tinham um alinhamento com Luiz Henrique Mandetta;
    Como Mandetta era o ministro mais popular do governo, poderá ocorrer, no curto prazo, um aumento na desaprovação de Bolsonaro;
  • Mandetta pode acabar contemplado com algum cargo de visibilidade no governo de São Paulo ou em Goiás, fortalecendo uma potencial aliança de centro visando as eleições de 2022;
  • A saída de Mandetta agrada a base social bolsonarista, o que contribui para manter esse grupo mobilizado e fiel ao presidente;
  • O governo Bolsonaro tende a ficar mais delimitado à direita e influenciado pela ala ideológica em meio à “fuga” de aliados centristas;
  • Pode crescer a pressão do bolsonarismo em favor da adoção do medicamento hidroxicloroquina para os pacientes que contraíram a covid-19 e estão no estágio inicial da doença;

    QUEM É NELSON TEICH

É formado em medicina pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Se especializou em oncologia no Instituto Nacional de Câncer (Inca). Atualmente é sócio da Teich Health Care.

É doutor em Ciências da Saúde pela Universidade de York, do Reino Unido. Também prestou consultoria nessa área no Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo.

Na campanha presidencial de 2018, atuou como consultor informal da campanha do então candidato Jair Bolsonaro. Fundou, em 1990, o Grupo Clínicas Oncológicas Integradas (COI) e foi seu presidente até 2018. Em 2016, criou a Medinsight – Decisões em Saúde, empresa de pesquisa e consultoria em economia da saúde.

Participou do governo Bolsonaro de setembro de 2019 a janeiro de 2020, quando foi assessor do secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Denizar Vianna.

Nelson Teich foi também sócio de Vianna no MDI Instituto de Educação e Pesquisa.

Posicionamentos sobre o coronavírus

Em recente artigo intitulado “COVID-19: Como conduzir o Sistema de Saúde e o Brasil” afirmou que o isolamento social é a melhor estratégia para o momento.

Segundo Teich, “diante da falta de informações detalhadas e completas do comportamento, da morbidade e da letalidade da covid-19, e com a possibilidade do Sistema de Saúde não ser capaz de absorver a demanda crescente de pacientes, a opção pelo isolamento horizontal, onde toda a população que não executa atividades essenciais precisa seguir medidas de distanciamento social, é a melhor estratégia no momento. Além do impacto no cuidado dos pacientes, o isolamento horizontal é uma estratégia que permite ganhar tempo para entender melhor a doença e para implantar medidas que permitam a retomada econômica do país”, diz um trecho do artigo.

Sobre a flexibilização do isolamento social, Nelson Teich disse que “sendo real a informação que a maioria das transmissões acontecem a partir de pessoas sem sintomas, se deixarmos as pessoas com maior risco de morte pela covid-19 em casa e liberarmos aqueles com menor risco para o trabalho, com o passar do tempo teríamos pessoas assintomáticas transmitindo a doença para as famílias, para as pessoas de alto risco que foram isoladas e ficaram em casa. O ideal seria um isolamento estratégico ou inteligente”.

O novo ministro da Saúde também é favorável aos testes em massa como forma de conter o avanço do coronavírus no país.

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