Reforma política é assunto recorrente no Congresso Nacional nos últimos trinta anos. Pena que Marco Maciel, hoje aposentado por grave enfermidade, não mais frequente os plenários das duas Casas. Ele é autor de diversos projetos e iniciativas destinadas a regulamentar o voto no Brasil. A democracia brasileira é capenga. O cidadão em São Paulo corre o risco de votar em Paulo Maluf e eleger José Genoíno. Ou vice versa. A coligação na eleição proporcional é responsável por essa mágica.
O atual sistema não funciona. Só existe similar nos países nórdicos, cuja situação econômica e financeira é completamente diferente. A verdade é que os partidos não existem no Brasil, exceção dos ideológicos. Há uma proliferação de legendas, mais de trinta deles, o que pulveriza a ação política e impõe uma distribuição de poder absolutamente enlouquecida. A cada votação, o Palácio do Planalto é obrigado a rever sua lista, entregar este ou aquele cargo para determinado partido em troca de votos no Parlamento.
No momento da eleição, os trinta e tantos partidos generosamente vendem seu apoio negociando o horário político. Trinta segundos valem muito neste mercado. Além de receber dinheiro do fundo partidário, os donos dos partidos ainda embolsam o resultado das vendas de seu espaço no rádio e na televisão. O grupo que comanda a coligação faz uma relação enorme de beneficiados. E o eleitor que queira votar em Maluf termina consagrando Genoíno, sem saber. É a pior das situações.
Aconteceu muita coisa nos últimos tempos. O país está destruindo e construindo várias instituições a um só tempo. A primeira consequência das investigações da operação Lava Jato foi proibir doação de pessoa jurídica. Isso é o que faz o famoso caixa dois e proporciona a lavagem de dinheiro. Ou seja, grana ilícita, torna-se lícita ao ser doada para candidato ou partido. Enfim, dinheiro de eleição não existe mais. As campanhas terão que ter menor custo.
O sistema alemão
Agora, reforma política deixou de ser uma ideia vaga de aperfeiçoar o sistema. Passou a ser necessidade. Ao lado disso, os parlamentares querem se proteger contra as investigações solicitadas pela Procuradoria Geral da República. Surge, então, a salvação: o voto em lista. Este método, conhecido como sistema alemão, foi introduzido naquele país logo depois da segunda guerra mundial. Os líderes da Alemanha Ocidental queriam garantir a permanência no poder de um grupo político e evitar a ascensão dos comunistas. Havia partido comunista na Alemanha Federal.
O voto em lista funcionou maravilhosamente bem na Alemanha. A elite conduziu o país com firmeza e objetividade nos anos difíceis da guerra fria até a reunificação. Os eleitores votavam nos partidos que escolhiam os nomes de quem seria eleito. A fidelidade partidária, neste sistema, é implícita. Quem sair de um partido e entrar em outro vai para o último lugar na lista. É difícil e raro abandonar a legenda. Na Itália, adotou-se sistema semelhante para manter o poderoso Partido Comunista Italiano à distância do poder. Também funcionou.
Não é por acaso que o Partido dos Trabalhadores defende, há muito tempo, o voto em lista. É a maneira, chamada democrática, de manter uma elite no poder por tempo indeterminado. Trata-se do sonho do grupo majoritário naquela legenda. E boa parte dos parlamentares quer se proteger contra a Lava Jato. Não precisarão correr atrás do eleitor na próxima eleição, se o voto em lista for aprovado. O candidato escapa das vaias, das provocações, dos xingamentos e participa apenas dos comícios eletrônicos ao pedir votos para sua legenda.
Temer: voto distrital
Essa solução não é razoável e agride a tradição brasileira de votar em candidatos, não em partidos. A sugestão do presidente Temer parece mais adequada. É o distritão. Cada candidato concorre dentro de seu estado. Quem tiver mais votos vence, simples assim. Já o voto distrital divide o estado em distritos. Nos Estados Unidos os distritos são grandes. Na Inglaterra, são pequenos. Mas o princípio é o mesmo: o candidato apresenta-se aos eleitores apenas naquele distrito. Quem obtiver maior votação está eleito.
Se nada disso for alcançado, o Congresso trabalhará bem se aprovar a cláusula de barreira (o partido só pode ter representação no Congresso se obtiver dois ou 3% do total dos votos, em oito ou nove estados) e o fim da coligação na eleição proporcional. Esse é o caminho para que o eleitor tenha plena informação a respeito do candidato em que ele vai votar. É mais simples, mais rápido, mais objetivo. O voto em lista, no Brasil, nessa altura dos acontecimentos, constitui, sem dúvida, o verdadeiro golpe.