O economista Raul Velloso, um dos maiores especialistas do país em finanças públicas, não vê saída para a aguda crise econômica fora da retomada dos investimentos públicos e privados. “A saída da recessão só poderá ocorrer por meio do investimento. Não só público quanto privado. Se (o ministro Nelson Barbosa) não conseguir isso, esqueça…”, afirma ele. O problema, segundo Velloso, é que o investimento privado só voltará se o empresário vislumbrar uma solução para a crise fiscal. O que não será possível sem apoio do Congresso na criação ou aumento de imposto, algo difícil de conseguir.
O que achou da saída do Levy?
Ele já havia esgotado suas possibilidades, perdido energia. Chegou com muitas propostas, trouxe gente para sua equipe encarregada de fazer coisas como uma nova lei das PPPs, ideias que eram para outra época, para outro Brasil. Hoje, vivemos uma crise aguda, o problema é de execução e não de inventar novidade. Desde o início, o Levy foi sendo percebido como um ministro à parte, como se não tivesse nada a ver com o governo, o que é ruim. Se desse certo, ok, mas se desse errado… a verdade é que ele não teve apoio, de fato. Em nenhum momento a presidente Dilma deu uma declaração clara de respaldo à política do Levy. Sua missão era ganhar o investiment grade. Não conseguiu. Perdeu sentido. Não se pode governar sem o governo, como ele tentou.
E o que acha da entrada do Barbosa?
Ele não padece desse mal que acabei de falar, mas entra num momento em que o governo e a economia estão muito mal. Tendo a presidente Dilma ao seu lado, corre o risco de cair junto com o governo, se não conseguir encontrar uma solução para a grave crise econômica. Vai ter que dizer qual será a sua política. É o que todos esperam dele neste momento.
Qual a solução para a crise?
Só tem uma: tirar o país da recessão. Isso tem que ser a prioridade. Se o ministro não der esse sinal, todo mundo continuará sem rumo. E a saída da recessão só poderá ocorrer por meio do investimento. Não só público quanto privado. Tem que haver um mutirão de investimento. Se não conseguir isso, esqueça… é preciso destravar os investimentos principalmente por meio das concessões de infraestrutura que foram aprovadas nos últimos dois anos e estão empacadas por culpa do governo.
Por que a crise atual parece pior do que todas as anteriores?
Porque as crises anteriores eram de escassez de divisas e de consumo. Eram crises de desequilíbrio externo, e, mais recentemente, pela primeira vez houve uma crise de consumo, mais fácil de resolver. Quando o problema é esse, que também apareceu um pouco agora, resolve-se por meio da exportação, da depreciação da taxa de câmbio, o que já está acontecendo. Mas isso é pouco, pois tem menor peso na demanda agregada. Desde 2014 a economia não cresce por falta de capacidade de crescimento da própria economia, embora houvesse ocupação elevada. Ou seja, é preciso descobrir um jeito de recuperar aquela capacidade – o que só se faz com investimento – e em seguida aumentá-la, mas como se há uma crise fiscal?
Por que no passado as crises se resolviam rapidamente?
Porque havia a pressão do FMI, para que a economia fosse estabilizada, e uma boa margem para aumentar a carga tributária. Então a economia se recuperava rapidamente. Isso acabou. No passado, havia crise fiscal mas não uma crise política capaz de impedir a elevação da carga tributária. Se a crise fiscal de hoje estivesse acontecendo no passado, a CPMF já teria sido aprovada sem grandes problemas no Congresso. Aí, recuperava-se a situação fiscal, a confiança voltava e o país retomava os investimentos.
E como se recupera a confiança num quadro como o atual?
Só se recupera a confiança com a solução do problema fiscal. Sem isso, não há como. Resolvida essa parte, destrava-se o investimento. O xis da questão é o investimento, porém o empresário só voltará a investir se vislumbrar uma solução para a questão fiscal lá na frente. E a questão fiscal – diante da extrema rigidez do gasto no curto prazo – só será superada com aumento ou criação de imposto. Só que o governo não tem apoio político para fazer isso. O dado novo importante é a falta de base política. Eu não me lembro de uma situação tão complicada quanto essa nos últimos 20 anos.
Então estamos num beco sem saída…
A presidente pode tentar soluções de longo prazo, como a reforma da Previdência, com a qual o novo ministro até já acenou. Mas você acredita que o Congresso vai se debruçar sobre uma saída como essa neste momento, num ano eleitoral, de cobranças sistemáticas aos políticos? Eu acho que não. O governo pode até enviar uma reforma como essa para o Congresso – e deveria fazer isso –, mas ela não será examinada para valer. A alternativa, então, é imposto novo, que terá todos contra. A presidente não terá forças para ações políticas decisivas, que promovam uma virada na situação atual de grande dificuldade.
O que pode acontecer, então?
A presidente vai ficar lame duck (pato manco, como se diz nos Estados Unidos a respeito do presidente em final de mandato, como Barak Obama), sem condições de reagir. Não tem outro jeito.
Mas, e essa proposta de tributar a distribuição de dividendos, que poderia arrecadar algo como R$ 40 bilhões?
Não passará. Os especialistas dizem que é bitributação, porque a empresa já paga imposto sobre o lucro. Atinge um universo muito grande, tem muita gente contra, os acionistas vão reclamar, não haverá adesão consistente a uma proposta como essa.