Chegamos ao inevitável: a votação da admissibilidade do impeachment contra a presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados. Não há nenhuma surpresa no que está acontecendo. E não será surpresa se a admissibilidade for aprovada na Câmara e, na sequência, no Senado.
De forma incansável, Dilma destruiu todas as pontes com o mundo político. Destruiu, também, o software político do lulismo e o substituiu por coisa nenhuma. Nem mesmo a oposição seria capaz de tamanha proeza: destruir, ao mesmo tempo, o mito Lula e seu modelo de fazer política.
O ex-presidente Lula, por sua vez, cometeu o erro capital de escolher Dilma para ser sua sucessora. Qualquer outro nome teria sido bem melhor. O pior burro é aquele que, ao fazer as coisas não aprende com seus próprios erros.
Em fevereiro de 2013, em texto publicado no finado Brasil Econômico, alertei para o fato de que o governo Dilma vivia uma situação de fracasso assintomático. Em especial, pela incapacidade de fazer política, de cuidar da credibilidade fiscal e empresarial do país e de ter abandonado o diálogo com a sociedade.
Evidentemente, a Operação Lava-Jato tem imensa responsabilidade no naufrágio do lulismo. Arno Augustin também deu grande ajuda ao jogar no lixo a responsabilidade fiscal. Ambos os fatos colocaram o governo no corner. Mas, com um mínimo de competência, teriam adiado o desfecho.
Com inteligência, Dilma teria formado um governo de coalizão de verdade, voltado para compor uma maioria operacional no Congresso. E para se proteger das intempéries e criar condições para avançar nos temas que pressionam a nossa realidade.
Porém, não houve discernimento para entender a real necessidade de se fazer uma coalizão de verdade nem capacidade operacional para concretizá-la. Dilma e setores do PT, a partir de uma visão autoritária de poder, acharam que mandavam no Brasil pelo fato de terem eleito a presidente.
Lula sempre entendeu que coalizão era o segredo da governabilidade. Uma coalizão que englobasse partidos, caciques políticos, empresários, trabalhadores, movimentos sociais, banqueiros, entre outros, seria a chave para governar o Brasil tendo o Estado como árbitro. Dilma jamais entendeu isso.
Agora, faltando poucos dias para se votar a admissibilidade, o que restará para Dilma, Lula e o PT?
A presidente deve passar o resto da vida se defendendo de processos judiciais no Brasil e no exterior. Será uma vida de guerrilha jurídica e de negação de malfeitos. Irá introjetar, para usar a linguagem de Alberto Roberto, o inesquecível personagem de Chico Anysio, o papel de vítima. Será vítima e estandarte da narrativa que Lula irá empregar. Dilma será exibida como a “mãe dos pobres” que foi apeada do poder por ser justamente a mãe que os pobres tanto necessitam.
O papel de vítima de Dilma serve para Lula, que ganhou uma narrativa, depois de Dilma destruir a sua própria. O “golpe” contra Dilma dará a Lula o discurso que ele precisa para percorrer o Brasil em campanha eleitoral visando 2018 ou antes. Lula vai correr o país dizendo que o “golpe” aconteceu porque os pobres estavam levando vantagem contra os ricos.
Porém, para o PT, a situação é mais grave. O partido está vivendo um processo de desidratação e pode se fragmentar. Mais de 1/3 da bancada na Câmara ameaça se desfiliar e criar uma nova agremiação. Esses parlamentares estão agrupados na facção Muda PT e podem fundar um novo partido. O PT vai pagar a conta mais alta do fracasso de Dilma.
Enfim, ao escolher Dilma para a Presidência, Lula cometeu um erro político capital. E destruiu o sonho de continuidade do lulismo e, até mesmo, do PT pelos tempos futuros. A lição que fica é a constatação de que o Brasil rejeita projetos hegemônicos e que tudo continuaria mais ou menos bem se Dilma e seu entorno tivessem entendido que se deve compartilhar o poder para governar.