A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu em sessão virtual, na tarde de ontem (28/04/21), por unanimidade, que em áreas urbanas consolidadas, o afastamento mínimo das margens dos cursos d’água deve ser o previsto no Código Florestal, de no mínimo 30 (trinta) metros, e não o disposto na lei de Parcelamento Urbano do Solo, de 15 (quinze) metros.
Até então, a lei de Parcelamento do Solo Urbano vinha sendo aplicada por alguns dos Tribunais Brasileiros, de forma que edificações que não respeitavam o limite mínimo de 30 (trinta) metros das margens de rios eram mantidas. Entendia-se que a lei de Parcelamento era aplicável por tratar especificamente de áreas urbanas, onde a existência da cidade já está bem desenvolvida, situadas às margens dos rios. Preservava-se, assim, o empreendimento.
Mas a matéria (lei de Parcelamento ou Código Florestal em áreas urbanas consolidadas) sempre foi controversa nos próprios Tribunais e, por este motivo, havia sido afetada para julgamento no STJ em 07/08/19 nos Recursos Especiais 1770760, 1770808 e 1770967, todos de Santa Catarina.
A Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil, participou do julgamento na condição de Amicus Curiae, devido à relevância do julgamento para o setor em âmbito nacional. O procurador, em sustentação oral, requereu a modulação dos efeitos da decisão para que alcançasse fatos posteriores, a fim de que fosse preservada a segurança jurídica de imóveis já construídos com base na Lei de Parcelamento do Solo Urbano. Em acréscimo, o advogado ressaltou o entendimento consolidado na Suprema Corte de que o dano ambiental é imprescritível, de modo que construções muito antigas poderiam ser “alvo” de ações judiciais do Ministério Público para que sejam demolidas.
No que tange à modulação dos efeitos, o Ministro Benedito Gonçalves, relator do julgamento, propôs que os efeitos da decisão tivessem eficácia a partir do seu trânsito em julgado, para privilegiar a segurança jurídica. Porém, a modulação não foi acatada pelos demais Membros, que destacaram que este é o entendimento da Corte Superior há muitos anos.
Desse modo, a Corte Superior definiu que os efeitos da decisão podem alcançar tanto a casos antigos, sem qualquer limitação temporal, quanto a futuros.
O Ministro Mauro Campbell Marques ressaltou, em seu voto, que “não estamos aqui a criar um título judicial para sair demolindo aquelas obras que não sofreram até hoje nenhuma atuação do Estado (…), em todos os níveis, que se siga o processo legal em todos os casos, (…) tanto a matéria foi controversa e é controversa”.
Apesar da dúvida lançada pelo voto do Ministro, certo é que, na prática, isso pode significar grave insegurança jurídica para edificações licenciadas com base na lei de Parcelamento do Solo, que prevê distanciamento menor de cursos d`águas do que o Código Florestal, sem que seja levado em consideração a fase da obra, se em andamento ou há muitos anos concluída.
Conforme já colocado, é pacificado nos Tribunais Brasileiros que a reparação de dano ambiental não está sujeita ao decurso do tempo, o que significa praticamente uma carta branca para que órgãos que atuem em defesa do Meio Ambiente busquem meio para providenciar a demolição de edificações que esteja em desconformidade com o Código Florestal.
A decisão, ainda não publicada, mas certamente com efeitos imediatos, impactará principalmente construtora, loteadoras e incorporadoras, as quais poderão ter um passivo de considerável monta com construções urbanas em desconformidade com o Código Florestal.
Ao que tudo indica, a controvérsia, em especial sobre os efeitos da decisão, não parecer ter sido definitivamente pacificada, mas certo é que poderá servir como parâmetro para futuros empreendimentos que buscam primar por um mínimo de segurança jurídica.
Texto por: Gabriela Cristina Silveira. Publicado originalmente no portal Migalhas