Os recentes problemas para a importação de insumos da China para a produção de vacinas contra a COVID-19 realçaram as dificuldades diplomáticas do país com o Brasil. Na semana passada, o Instituto Butantan anunciou que praticamente esgotou a quantidade de matéria-prima para fabricar a CoronaVac, e que agora depende da chegada de novas remessas para prosseguir com a imunização. O laboratório Sinovac, que produz o imunizante em parceria com o Butantan, possui lotes prontos para a entrega. Entretanto, estes materiais aguardam o aval das autoridades chinesas para realizar a exportação.
Desde a notícia de que os impasses diplomáticos com o governo Bolsonaro seriam a causa para a demora no recebimento, diversos líderes políticos têm se manifestado sobre o assunto. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), participou de reunião na semana passada com o embaixador da China no Brasil, Yang Wanming. Maia disse na ocasião que ficou a impressão de que o governo federal não teria se comunicado com a embaixada para resolver o problema. O diretor do Butantan, Dimas Covas, cobrou o governo Bolsonaro para que trabalhe em prol da liberação dos insumos. Em carta ao presidente, 15 governadores pediram que o governo federal acionasse a diplomacia para abrir diálogo com a China e encontrar uma solução para a produção da CoronaVac.
Bolsonaro, por sua vez, afirma que não houve estremecimentos nas relações entre os países, e disse que tem mantido conversas com autoridades. Bolsonaro diz que não fechou as portas para os demais países, mas que busca preservar a sua soberania. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que as tentativas de importação seguem o processo normal, mas que não há previsão de chegada. Araújo disse que o motivo da demora da liberação pelo governo chinês foi uma série de pequenos passos administrativos.
Na semana passada, a embaixada da China no Brasil informou que fará esforços máximos para conseguir avanços no processo de envio. Em nota, a embaixada disse que a China sempre apoiou e continuará apoiando o fortalecimento de cooperação na área de vacinas entre as empresas e instituições dos dois países. Afirmou também que, para os chineses, o único objetivo de pesquisar e desenvolver vacinas e promover a cooperação internacional é salvar mais vidas.
Relações diplomáticas
Especialistas afirmam que, se o governo brasileiro tivesse estabelecido um relacionamento mais simpático e fluido, a posição chinesa para enviar os insumos da vacina seria mais proativa. Há muito tempo percebem-se atritos nas relações diplomáticas com o gigante chinês. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, disse em março de 2020 que a China era a culpada pela pandemia. O ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse também que o país asiático teria ganhado com a disseminação do coronavírus.
Em outubro, Bolsonaro disse que não compraria a CoronaVac. O motivo claro seria o embate com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). O presidente também disse diversas vezes que a vacina chinesa não era segura. Eduardo Bolsonaro também acusou a China de fazer espionagem por meio da tecnologia de rede 5G.
Em julho de 2020, o governo federal teria faltado a um encontro entre representantes de países da América Latina e a China. A reunião tinha como objetivo promover o acesso da região às vacinas que fossem produzidas na Ásia, e o anúncio de linha de crédito de US$ 1 bilhão para permitir que governos latinos pudessem ter acesso aos imunizantes. A ausência do Brasil teria sido recebida como um sinal de que o governo Bolsonaro não estava interessado em negociar maior acesso a vacinas. Os líderes mexicanos, que foram os responsáveis por organizar a cúpula, disseram que enviaram convite ao Brasil, mas não receberam explicação pelo não comparecimento.