Pressionado pelo risco de derrota, o governo mudou a estratégia a cerca da discussão da PEC da autonomia financeira do Banco Central (65/2023). Inicialmente contrário a qualquer avanço, o Planalto se viu forçado a reconsiderar sua posição após perceber que a emenda tem votos suficientes para ser aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Neste contexto, o governo decidiu entrar no debate para forçar ajustes no texto. O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), adiou a votação e argumentou que tanto o presidente Lula quanto o Ministério da Fazenda não se opõem à autonomia financeira do Banco Central (BC). No entanto, Wagner ressaltou a necessidade de evitar que o BC se transforme em uma empresa pública.
Segundo o senador, isso poderia impactar negativamente as contas públicas. Nos bastidores, se discute a possibilidade de transformar o BC em uma entidade jurídica especial, uma solução já adotada em outros países. Assim, o governo teme que aprovação da proposta crie um efeito cascata, incentivando outras agências reguladores a buscar mudanças semelhantes nos modelos orçamentários.
Economista critica PEC
Cristina Helena de Mello, doutora em Economia pela Fundação Getúlio Vargas e participante do Programa de Educação em Gestão Global na Universidade Nankai, China, criticou a PEC. Para Mello, a forma como a proposta está sendo conduzida, no final do mandato do atual presidente do Banco Central, que tem uma posição contrária ao presidente da república, é desonesta.
“Acredito que há uma desonestidade no apressamento desta PEC. Não temos maturidade e discussão para entender a extensão dessa alteração, sobre o que ela implica e sobre o que significa essa gestão. Qual modelo internacional nós estamos seguindo?” questiona Mello. Ela destaca que nos Estados Unidos, por exemplo, as decisões sobre a taxa de juros do Federal Reserve (FED) são submetidas ao Congresso e ao Senado, criando uma limitação política à autonomia do FED.
Mello levanta preocupações sobre a autonomia orçamentária do Banco Central brasileiro, que atualmente gerencia os títulos da dívida pública. Ela questiona se o BC deveria se submeter ao Tesouro Nacional, que é o emissor inicial desses títulos, ou operar independentemente através da senhoriagem. A economista também indaga sobre a gestão cambial e o enorme poder do Banco Central em definir taxa de juros, inflação e câmbio, ressaltando que tal poder pode ser superior ao do presidente da república.
“A autonomia do Banco Central é algo imperativo, mas precisamos garantir que técnicos não eleitos não exerçam um poder desproporcional sem representatividade política. No entanto, o Banco Central não pode se subjugar aos desígnios de um presidente populista, que pode causar inflação por motivos políticos”, conclui Mello.
Por fim, a PEC deve retornar à pauta da CCJ do Senado na próxima semana. No entanto, o governo planeja adiar a discussão para o segundo semestre enquanto busca uma alternativa ao modelo de empresa pública.