No Estado mais afetado pelo coronavírus, tendo registrado até agora 459 infectados e 15 mortos, João Doria (PSDB) assumiu o protagonismo entre os governadores no anúncio das medidas de restrição destinadas a conter o avanço da epidemia.
Doria, até agora, declarou em estado de calamidade pública em São Paulo, fechou todo o comércio no Estado, assim como dos serviços considerados não essenciais, e determinou a quarentena desta terça-feira (24) até o dia 7 de abril.
Neste protagonismo assumido por João Doria, tem chamado atenção alguns gestos do governador. O anúncio das medidas restritivas ocorre no Palácio dos Bandeirantes. Doria costuma aparecer acompanhado do médico Davi Uip, que lidera o Centro de Contingência do coronavírus no Estado, e do secretário de Saúde, José Henrique Germann.
O tom inicial das coletivas procura ser técnico e tenta passar tranquilidade para a população. Entretanto, na parte final do anúncio das medidas e nas respostas aos questionamentos da imprensa, João Doria tem subido a cada dia o tom das críticas em relação ao presidente Jair Bolsonaro.
Na última semana, por exemplo, Doria prestou solidariedade à China, numa crítica à polêmica criada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que criticou a China no combate ao coronavírus, gerando um início de crise diplomática que vem sendo contornada.
João Doria, ao responder aos questionamentos dos repórteres, afirmou ainda que “estamos fazendo o que ele (Bolsonaro) não faz, que é liderar processos, liderar a luta contra o coronavírus, mão minimizar processos. Compreender a importância do respaldo da informação científica e da área da medicina e estabelecer diálogo e entendimento com prefeitos e governadores”.
Doria também afirmou que “lamenta dar essa informação de que estamos fazendo aquilo que deveria caber ao líder do país, que é o presidente Jair Bolsonaro”.
Diante do aumento do número de mortes em São Paulo, e que crescerão nas próximas semanas, o governador tem utilizado os equívocos de Bolsonaro na condução da crise para minimizar desgastes.
Aliás, não foi por acaso que João Doria, mesmo elogiando a atuação do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), não concordou com a avaliação de que o sistema de saúde entrará em colapso em abril. Segundo Doria, isso não ocorrerá no Estado de São Paulo.
Ao menos no curto prazo, as medidas restritivas adotadas por Doria e outros governadores deve manter a tensão com o presidente Jair Bolsonaro. No último sábado (21), diante dos anúncios feitos pelos governadores, Bolsonaro editou medidas que garantem ao governo federal a competência sobre circulação interestadual e intermunicipal.
Em entrevista do programa do Ratinho na sexta-feira (20) à noite, Bolsonaro declarou que “tem certos governadores que estão tomando medidas extremas, que não competem a eles. Fechar aeroporto, fechar rodovias, não compete a eles. Fechar shopping, fechar feita, etc. Se o comércio para, o pessoal não tem o que comer. Precisamos de medidas equilibradas e não levar pânico. Daqui a pouco vão ter problemas de saques, temos que buscar evitar isso. Evitar que a curva seja acentuada. Vamos superar juntos isso aí”.
Enquanto o presidente mostra maior preocupação com o possível colapso econômico e, por isso, tem criticado os governadores, eles buscam restringir cada vez mais a circulação com objetivo de reduzir novos casos de COVID-19 e mortes.
Como possíveis mortes ocorrerão em seus estados e municípios, os deslizes de Bolsonaro acabaram virando uma oportunidade para o compartilhamento do desgaste da crise sanitária com o presidente.
Do ponto de vista político, João Doria é quem mais está se destacando entre os governadores. Suas ações mostram sinais de quem está orientado por pesquisas. Além da montagem de um gabinete de crise, Doria é um comunicador.
Embora ainda seja cedo para projetar cenários, os indícios são que a mudança da conjuntura política provocada pelo coronavírus abalou a imagem de Jair Bolsonaro e fortaleceu João Doria como presidenciável.