Início » Hamas desmascara narrativa de transição de entidade armada para política

Hamas desmascara narrativa de transição de entidade armada para política

A+A-
Reset
ArtigosDestaque

Na manhã de hoje, 7 de outubro, o grupo palestino Hamas orquestrou um ataque de magnitude notável contra o Estado de Israel.

A região sul de Israel testemunhou uma série de investidas em pelo menos oito localidades distintas, com a presença de infiltrados do Hamas em solo israelense, culminando em ataques com foguetes.

Prontamente, o Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu proclamou um estado de “guerra” contra o Hamas, enquanto nações como o Brasil e os Estados Unidos, juntamente com vários outros países, manifestaram veemente condenação aos atos perpetrados pelos palestinos. Essa conjuntura impõe um panorama de múltiplas dimensões que merece análise aprofundada.

Em primeiro lugar, torna-se imperativo compreender que a contenda entre o Hamas e a Autoridade Palestina remonta a 2007, quando o Hamas estabeleceu o seu domínio em Gaza.

A posição do Hamas é intricada, uma vez que sua popularidade entre os palestinos declina e os laços diplomáticos entre Israel e a Autoridade Palestina se estreitam. Isso confere à Autoridade Palestina um tom de formalidade, enquanto o Hamas perdura sendo considerado por Israel como uma entidade de índole criminosa.

Neste cenário, a transição do Hamas, fragmentado em facções, de uma entidade armada para um ator político, enfrenta desafios substanciais.

A presente ofensiva do Hamas, ocorrida nesta data, compromete irremediavelmente a narrativa de independência da Autoridade Palestina por meio do diálogo. Os ataques lançam por terra as tentativas de fomentar um diálogo construtivo entre a Autoridade Palestina e Israel, ainda que o Hamas seja o arquiteto da ruína desse diálogo.

Notavelmente, até um período recente, diplomatas israelenses em Washington nutriam a percepção de que a Autoridade Palestina estava efetivamente estimulando indiretamente o Hamas na sua transição de entidade armada para uma perspectiva política.

Os eventos de hoje desmascaram essa ilusão. Enquanto o Hamas optou por uma abordagem de “tudo ou nada”, visando estabelecer-se como a única alternativa viável para a resistência palestina contra Israel, o governo israelense enfrenta uma encruzilhada monumental.

Além de suportar ataques sem precedentes, que englobam o disparo de mais de 2 mil foguetes, Israel viu vários de seus cidadãos serem sequestrados pelo Hamas, na tentativa de manter um controle sobre as negociações e deter o ímpeto inclemente que Netanyahu anseia imprimir.

Ademais, outro elemento crítico transcende a dinâmica preexistente entre Israel e o Hamas.

Em 2017, o governo iraniano reatou laços significativos com o Hamas, justamente quando o financiamento da entidade oscilava, em razão de sanções econômicas e negociações progressivas estabelecidas pelo P5+1 (os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha).

Leia mais! Dino participa de audiência em comissão da Câmara na terça-feira

O Irã mantinha, até então, uma relação intermitente com o Hamas e o Hezbollah, no Líbano. Todavia, quando o então Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, denunciou o acordo nuclear com o Irã, argumentando que este favorecia exageradamente o regime do Aiatolá Khamenei, ocorreu um pressuposto de que o Irã, pressionado pela penúria econômica, retornaria à comunidade internacional de forma mais amena.

Contudo, tal previsão revelou-se inadequada, pois o vácuo resultante foi ágilmente preenchido pela China, que fortaleceu sua influência na região por meio de acordos bilaterais com nações locais, incluindo o Irã.

Essa dinâmica reacendeu as finanças iranianas, permitindo a revitalização das relações com o Hamas, sobretudo do ponto de vista financeiro. A prosperidade econômica induzida pelas exportações de petróleo para a China fortaleceu consideravelmente a capacidade do Irã de influenciar grupos como o Hamas e o Hezbollah.

À luz dos atuais ataques, e da declaração de Netanyahu afirmando que Israel está em estado de guerra, emerge a expectativa de que as operações militares israelenses possam abranger não apenas o Hamas, mas se estender até Teerã. Essa possibilidade desencadeia uma série de implicações geopolíticas, que requerem atenção redobrada dos Estados Unidos e da China.

O Irã, não surpreendentemente, congratulou o Hamas pelos ataques de hoje. No início de setembro, representantes do governo iraniano e membros do Hamas realizaram um encontro no Líbano, cujas conclusões indubitavelmente informarão futuras análises e reflexões em Israel.

Permanece uma interrogação relevante sobre se os ataques contra Israel serão confinados ao Hamas ou se o Hezbollah aproveitará a conjuntura para lançar uma ofensiva similar. Nesse contexto, é plausível que, em caso de ataque por parte do Hezbollah, as autoridades israelenses apontem ainda mais enfaticamente na direção do Irã.

Os próximos dias serão marcados por tensões e violência. Netanyahu, notoriamente, não é um líder inclinado a considerar o diálogo neste momento, independentemente de quem o proponha ou sugira.

A resposta de Israel, não apenas por intermédio das Forças de Defesa de Israel (IDF), mas também com o engajamento substancial do Shin-Bet e do Mossad, promete ser e intensificar-se, em paralelo à incerteza acerca do destino dos reféns mantidos pelo Hamas.

É oportuno lembrar que, em 2011, um soldado israelense, capturado pelo Hamas em 2006, foi libertado em troca de mil prisioneiros palestinos.

Esta dinâmica representa o ás que o Hamas espera, na atual conjuntura, em relação aos reféns que detém.

Por fim, persiste uma indagação de magnitude considerável na mente dos governos de Israel e dos Estados Unidos: por que os serviços de inteligência não previram esse ataque do Hamas?

Não obstante a posterior visibilidade de alguns sinais indicativos, tais como a reunião entre o Irã e o Hamas no Líbano, ocorrida no mês passado, bem como as narrativas internas articuladas por líderes do Hamas, o ataque surgiu de maneira tão surpreendente que exerce significativa pressão sobre os serviços de inteligência.

Estamos vivendo a Era da Geopolítica. A conectividade do mundo há 20 anos, gerou uma rede global de comércio, colaboração e globalização.

Hoje, as animosidades, conflitos e guerras fazem com que essas manobras geopolíticas impactem com violência e agressividade muitos países, por meio das mesmas teias de conectividade estabelecidas nos últimos 20 anos.

Os ataques de hoje contra Israel geram uma nova e importante vertente geopolítica que poderá afetar todos.

 

 

crise políticaGuerraThiago de Aragão

Usamos cookies para aprimorar sua experiência de navegação. Ao clicar em "Aceitar", você concorda com o uso de cookies. Aceitar Saiba mais