Assistimos à intensificação da tensão entre nações, característica de uma guerra fria agravada. Isso não é uma novidade, mas o quadro é complicado por dinâmicas econômicas contraditórias nos EUA, China e Europa. Paralelamente, a guerra na Ucrânia se desenrola com uma cascata de efeitos secundários que reverberam globalmente — quadro agravado pelo conflito em Israel.
Deparamos com circunstâncias sem precedentes que podem trazer consequências sérias ao Brasil. Estamos à beira de uma transformação da guerra fria em curso em conflito de proporções globais, considerando a inclinação para a beligerância e a imprevisibilidade dos líderes atuais.
A atual conjuntura guarda paralelos com a década de 1930, ecoando a máxima de que a história tende a se repetir — embora como uma espécie de paródia. Para o Brasil, os impactos de um conflito global seriam desastrosamente superiores aos da II Guerra. A interconexão global e a interdependência econômica amplificadas deixam-nos em posição mais vulnerável.
No período pré-guerra, o Brasil vacilou antes de se posicionar ao lado dos Aliados contra o Eixo. Hoje, observa-se um aparente desvio do país em direção a uma política externa reminiscente do Terceiro Mundo, com um alinhamento mais próximo aos interesses chineses e russos. Esse movimento gera questionamentos: por que tomar tal direção?
Nossa economia está atrelada em grande medida ao comércio de commodities com a China, conferindo a esse parceiro uma influência considerável nas relações comerciais. Além disso, nossa dependência dos insumos russos, especialmente fertilizantes e diesel, restringe nossa capacidade de adotar postura mais assertiva com esse parceiro estratégico. Simultaneamente, enfrentamos críticas e uma espécie de perseguição por parte dos países europeus no que tange às questões ambientais.
A diplomacia dos EUA, marcada pela confusão há algum tempo, carece de narrativa coesa e ferramentas eficazes para reforçar sua presença institucional no Brasil. Washington parece nos tratar como “não prioridade”, relegando ao setor privado as relações com o país.
Em um contexto complicado, o Brasil oscila entre um protagonismo ilusório e ações efetivamente relevantes, como as tentativas de mediar um cessar-fogo em Gaza. O país não demonstra o peso de uma grande potência nem atua como tal em um cenário mundial onde a dissimulação e a desinformação são estratégias geopolíticas corriqueiras.
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A biografia Putin, de Philip Short, revela a intricada teia da geopolítica ao narrar as manobras do líder russo desde o colapso da União Soviética. No trabalho de Short, que cobre os principais acontecimentos desde a queda do Muro de Berlim até a invasão da Ucrânia, o Brasil, para o bem ou para o mal, é mencionado apenas uma vez em um contexto singelo: nossa abstenção em uma votação de resolução da ONU em 2011.
Essa menção isolada reflete a posição do Brasil no xadrez geopolítico. Mesmo ostentando o status de uma das maiores economias do mundo, detendo vastos recursos naturais e sendo um dos principais produtores de alimentos, não ascendemos ao círculo das nações que dão as cartas no palco mundial.