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Três Abordagens da China na América do Sul

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Reconhecemos três linhas estratégicas estabelecidas pela China em sua relação política comercial com a América Latina. Essas três linhas de ação podem ser visualizadas de forma mais clara em três países do continente: Venezuela, Argentina e Brasil.

Na Venezuela, o fato de o país estar em um caos econômico e sem capacidade de executar pagamentos mínimos faz com que a China seja a grande credora em troca de pagamentos via ativos (o petróleo foi a moeda utilizada por muito tempo até que a capacidade de produção da PDVSA despencou).

Além disso, a Venezuela disponibilizou vários outros ativos no país como garantidores dos empréstimos feitos. Grandes propriedades rurais, por exemplo, são consideradas como garantias. Para um país que tem fechado o acesso a capital , só resta à Venezuela pagar com ativos no médio prazo.

A Argentina se encontra em uma situação intermediária. Apesar do empréstimo do FMI, o país sofre para conseguir pagar sua dívida, seus credores e investir no país. Para a China, entrar com linhas de financiamento na Argentina é muito interessante.

Ao contrário da Venezuela, a Argentina possui um parque industrial avançado, fazendas produtivas e uma forte produção de carne bovina. Além disso, Vaca Muerta e linhas de transmissões de energia são oportunidades que fazem brilhar os olhos dos chineses.

Oferecendo linhas de crédito com taxas de juros baixas, a China consegue abertura do governo local para participar de projetos e comprar empresas, obtendo concessões que representam uma vantagem estratégica. A construção da usina nuclear de Atucha III, com capital e tecnologia chinesa, é um desses grandiosos projetos em vias de implementação.

Além disso, a Argentina cogita buscar na China dinheiro para financiar sua dívida com credores e/ou com o FMI. Naturalmente, isso aumentaria a boa vontade do governo argentino para ampliar as ofertas aos chinesas, bem como abrir mais possibilidades de participações em concessões estatais.

No Brasil, a situação é diferente. Há uma super dependência comercial, mas não há problema de capital ou necessidade de financiamento. E ainda não temos dívidas com organismos ou credores internacionais que pressionem por uma maior abertura aos chineses.

Assim, a estratégia chinesa deve se assemelhar à estratégia de americanos e europeus: participar de licitações e realizar aquisições e fusões sem a intermediação do governo no processo. Como não há necessidade de financiamento, não existem ativos garantidores que possam se tornar chineses.

No entanto, a dependência comercial gera um ponto interessante : o receio de retaliação na compra de commodities brasileiros faz com que o governo brasileiro se encontre em uma encruzilhada em relação a participação da Huawei no leilão do 5G .

Excluir a empresa do leilão, como cogitado, poderia gerar retaliações nas áreas de agronegócio e minérios, ou até o impedimento no aumento das importações, mesmo que momentâneo, afinal a China depende desses produtos), gerando temor na bancada ruralista, aliada do governo na Câmara.

Como dizia o velho ditado: “pra cada caso, é um caso” e isso se aplica à perfeição nessa situação no continente. A China ainda demonstra dificuldade para entender que não existe um comportamento “latino-americano”. Cada país possui uma dinâmica própria.

A Nova Guerra Fria com os EUA terão um impacto significativo na região, principalmente em países que são mais sólidos economicamente, como o Brasil. Nos países em dificuldade, a recusa de financiamento chinês não ocorre, enquanto a oferta de linhas de crédito por parte dos EUA não deverá ocorrer tão cedo na mesma robustez das oferecidas por Pequim.

Assim, temas mais técnicos, como a Huawei, e geopolíticos, como cadeias de produção, trarão ao Brasil um pouco da tensão existente entre EUA e China.

Publicado no Correio Braziliense em 20 de junho de 2020

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