O presidente Michel Temer vive um paradoxo notável. Ele desfilou em Nova Iorque, durante a Assembleia Geral da ONU com aparência despreocupada. Nada o abala. Nenhuma notícia da loucura existente na política nacional faz com que ele perca a postura sempre serena, formal e séria.
Em Brasília, os políticos percebem que ele está se preparando para entrar no último ano de sua rápida administração. Isso significa que ele vai se envolver com a eleição presidencial.
As pesquisas, contudo, indicam que ele figura em baixíssima prioridade na vontade nacional. Ele, aliás, não foi eleito. Foi o vice de Dilma. Portanto, quem o colocou no Palácio do Planalto foi o PT e os seus milhões de eleitores. Petistas, com razão, não apoiam Temer e insistem na tese do golpe constitucional.
O tema já está meio passado, mas vale, ainda, o registro. O presidente ocupa sempre os piores lugares nos índices de popularidade. Os eleitores do PSDB também não gostam muito de sua figura porque ele, afinal, foi o adversário no último pleito. Restam, portanto, poucos grupos para apoiar Michel Temer.
No entanto, ele tem se revelado o melhor operador do Congresso Nacional nos últimos tempos. Enfrentou a fuzilaria do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot. Já caminha agora para esgrimir a segunda denúncia protocolada pelo chefe do ministério público contra ele.
Venceu a primeira com sobras, inteligência e capacidade de organizar suas forças. Deverá vencer a segunda com maior folga. Seu cacife aumentou justamente porque no horizonte começa a aparecer agora a eleição de 2018. E o presidente da República sempre tem como ajudar. E mais ainda como prejudicar uma candidatura.
A diferença entre a política e a economia no mesmo governo é abissal. O Banco Central prevê inflação de 3,2% neste ano. O país verá, segundo a instituição, crescimento de 0,7% do produto interno bruto. O resultado é muito bom. Os especialistas, no início do ano, apostavam em números negativos.
O balanço comercial está superavitário, o desemprego começa a ceder, a indústria automobilística apresenta perspectivas favoráveis e as engrenagens da economia voltaram a girar. A Bolsa de Valores ultrapassou 76 mil pontos. O dólar oscila ao redor de R$ 3,12. O futuro é bonito para quem está no mercado financeiro.
Na política, as perspectivas estão confusas. Os deputados finalmente conseguiram algum acordo na reforma política. Aprovaram o fim das coligações nas eleições proporcionais. Aquela sopa de letras que confundia o eleitor vai acabar, mas só a partir de 2020, quando poderá surgir a federação de partidos.
É invenção um pouco melhor: os partidos que se unirem na eleição terão que se manter unidos durante todo o mandato. Outro quesito importante foi aprovação da cláusula de barreira. Cada partido terá que ter 1,5% do eleitorado em nove estados. Se não alcançar este índice não terá acesso ao fundo partidário, nem a tempo de rádio e televisão. Em 2020, o índice mínimo será de 3%. O número de partidos vai se reduzir.
A eleição do próximo ano vai ser curiosa. Está proibida a doação empresarial, que foi a janela para lavar dinheiro desviado de órgãos públicos. Os candidatos terão que obter recursos em outras fontes. Desviar dinheiro do orçamento é impensável.
O senador Romero Jucá apresentou a solução: acabar com o horário político fora do período eleitoral e utilizar essa verba (que é paga às emissoras) junto com 50% das emendas parlamentares. O total fica em torno de R$ 3,6 bilhões. É bom dinheiro para realizar uma campanha razoável, apesar de a reforma política ter ficado muito abaixo do possível.
Mas o grande show da semana ficou por conta do voto do ministro Gilmar Mendes no julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a decisão de enviar, ou não, a denúncia do PGR à Câmara. Ele foi voto vencido. O resultado ficou em 10 a um.
Mas teve oportunidade de dizer que Rodrigo Janot, como Simão Bacamarte, em O Alienista, de Machado de Assis, deveria pedir a própria prisão provisória. “Mas não teve coragem para isso”. Afirmou que já houve procurador inepto, bêbado, mas não ladrão, referindo-se a Marcello Miller.
Alheio ao tiroteio, Temer transitou tranquilo na passarela brasileira. Os balaços não o atingiram. As delações passaram ao largo. Ele vai chegar ao período eleitoral em seu gabinete no Palácio do Planalto. E mais que isso, em condições de influenciar no processo. Ele deve ser leitor de Nietzsche. “O que não provoca minha morte faz com que eu fique mais forte”. É por aí.