Um relatório publicado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) cobra do Brasil uma reforma das regras sobre a atividade de mineração e garimpo. O texto destaca que a legislação desigual que existe hoje empurra os garimpeiros para a ilegalidade, gerando degradação ambiental. Também são apontadas fragilidades nas regras que tratam do processo de fechamento de minas – a recuperação do solo a ser realizada depois que uma jazida não é mais produtiva – e da segurança de barragens de rejeitos.
“O ambiente regulatório atual do Brasil é muito reativo, em vez de ser preventivo”, diz o documento.
Apelidada de “clube dos países ricos”, a OCDE é um organismo internacional que reúne os países mais economicamente desenvolvidos do mundo. Na prática, a organização funciona como um fórum para discussão de políticas públicas e o ingresso de um país é visto como um sinal de melhoria do ambiente de negócios.
Em janeiro, o Brasil recebeu a carta-convite para ser um país membro. Contudo, ainda há um caminho a percorrer antes que se possa concretizar a adesão ao grupo internacional, o que depende do atendimento às recomendações do grupo.
Pequenos mineradores
Em um dos seus principais pontos, o relatório da OCDE sublinha que o Brasil enfrenta dificuldades para definir regras para o garimpo, e, por isso, tem dificuldade em fiscalizar a atividade dos garimpeiros e evitar a degradação do meio-ambiente. Por outro lado, sem regras que regulem o trabalho, os garimpeiros acabam caindo na ilegalidade ou são submetidos a condições degradantes.
Para o advogado especialista na regulação do setor mineral e ex-diretor da ANM, Tomas de Paula Pessoa, ao impor uma burocracia exagerada, a legislação atual falha em prevenir a atuação ilegal de garimpeiros. Ele lembra que o relatório da OCDE aponta que o Brasil impõe as mesmas regras ao pequeno e ao grande minerador.
“Hoje temos uma burocracia muito grande. O garimpo é uma atividade autorizada através de lei, apesar de ter situações de ilegalidade. Mas os garimpeiros reclamam que solicitam um pedido de lavra garimpeira e passam anos esperando resposta, então acabam recorrendo à ilegalidade. O relatório aponta que o Brasil precisa ter exigências diferentes para o pequeno, para o médio e para o grande. Se as regras forem as mesmas, o pequeno acaba empurrado para a ilegalidade”, explica o especialista.
O ex-diretor da ANM também destaca que as regras atuais precisam ser atualizadas de modo a garantir segurança jurídica para a negociação entre empresas e investidores que atuam no setor. Segundo ele, é preciso atualizar o regramento para permitir e dar publicidade a contratos de investimento feitos no primeiro estágio da autorização de exploração mineral: a pesquisa. É nessa fase que, após autorização do governo, as empresas analisam o solo para checar se a mineração na área seria lucrativa.
“O período que é mais difícil, em que termos de captação de recursos, é o período da pesquisa. É o período em que você joga suas fichas e pode não dar nada. A cada mil projetos de mineração, um tem sucesso e se converte em mina”, pontua.
Outro ponto a ser melhorado, de acordo com a OCDE, é a legislação sobre a segurança e proteção dos trabalhadores. A análise mostra que há fragilidade na aplicação das regras de segurança nas minas subterrâneas e nas barragens de rejeitos.
Os desastres de Mariana (MG), em 2015, e de Brumadinho, em 2019, ocorreram justamente nesse tipo de barragem. A OCDE admite que, após o acidente, o Brasil passou a desenvolver regras mais rígidas, mas também pontua que é necessária a revisão das normas.
Para a OCDE, não está claro quais requisitos precisam ser exigidos durante o licenciamento ambiental das estruturas e como deve ser feito o fechamento das barragens de rejeitos.
Perspectivas para o novo código de mineração
Desde o governo Michel Temer, o governo tenta reformular as leis de mineração do Brasil. Sem ter sucesso na elaboração de leis, o regramento tem sido definido em decretos e outras medidas infralegais, que não dependem da aprovação do Congresso Nacional.
A proposta de um novo código para o setor surgiu em 2018, em uma Medida Provisória, que acabou rejeitada pelo Congresso. Já em 2021, um grupo de trabalho (GT) foi criado na Câmara dos Deputados com o objetivo de elaborar um projeto de lei para reunir e reformular o regramento existente. Contudo, o GT se dividiu no final de 2021, após a apresentação do relatório final e segue em hiato desde então.