Paulo Delgado: “O ministro da Fazenda precisa ter um perfil suprapartidário”


O que o sr. espera de 2016 na política?

Razoabilidade, pudor e patriotismo. Uma sociedade cuja cidadania não seja fictícia; um Congresso que não funcione como um sindicato de políticos; um modelo econômico que seja apresentado ao capitalismo de fato. E assim rompa com o capitalismo abstrato e o socialismo improdutivo, fazendo da criação de riqueza e da mobilidade social seus dois motores. Um presidente da República que não ache que o Brasil lhe deve algum favor e não queira vergar 204 milhões de pessoas aos seus caprichos. Um Supremo que não esterilize a vida política nacional com suas bizarrices interpretativas, como a de querer proibir chapa avulsa em parlamento com 35 partidos fictícios e impor voto aberto e intimidador para julgar presidente. Data máxima venia, como sou filho de juiz de direito, sem inteligência para a cordialidade que a humildade empresta ao poder democrático, a maioria do Supremo fingiu entender de regimento de legislativo e virou as costas para o pluripartidarismo. Julgou, errado, nuvem passageira, valendo-se da soberba de um poder sobre outro.

 

Com ou sem impeachment, o que o país precisa fazer para
reverter a grave crise política e econômica?

Aceitar as virtudes do capitalismo na produção da riqueza e corrigir os defeitos do estado na tributação e distribuição. Nosso maior problema é que as tendências desse processo de crise não se evaporam mantida a força dos personagens que a criaram. Aliás, esta é a dúvida que bloqueia o impeachment. Impeachment, quando não é baseado no código penal como o atual, visa organizar o governo que entra e interromper a desorganização do que sai. Como a crispação política, e o orgulho ferido da presidente impedem a compreensão real de sua motivação, tudo, embalado pela inércia do governismo e a urgência do oposicionismo, vai sendo levado a erro. Assim, 2016, infelizmente, vai permanecer ativo na história dos fracassos brasileiros.

Quem o sr. vê com condições de liderar o país para tirá-lo da crise?

No Palácio, alguém que reúna informação, erudição, credibilidade e bom senso é um bom começo. O senso de dever deve sempre ser mais forte do que o de oportunidade. Dilma, se visse além do seu tempo, poderia conduzir a mudança. Romper com o mercado precificado da política tradicional e mudar o paradigma do imediatismo que a fez bode expiatório nas mãos de Lula. Sairia consagrada como luz dos novos tempos. Mudar preservando, como deveria ser o movimento das marés na democracia. Como o horizonte político-econômico da crise é retroalimentado pela estreiteza de visão dos líderes é preciso uma fórmula inesperada e notável para a gestão econômica. Ajudaria bem um ministro da Fazenda que seja político respeitado e de perfil suprapartidário. Capaz de montar uma equipe de cinco mosqueteiros sustentada em três pilares: perfil técnico, alto gabarito acadêmico e trânsito pelo mundo. Ministro que liderasse: um Secretário do Tesouro ortodoxo, sem ser inflexível; um Secretário Executivo técnico, mas com trânsito no mercado; um Secretário da Receita Federal com poder sobre o subordinado e que seja eficiente para arrecadar, mas justo para tributar; um Secretário de Acompanhamento Econômico que admire o investimento produtivo e estratégico para a competitividade do país; um Secretário de Assuntos Internacionais que seja um diplomata independente e conheça a Ásia mais do que a África; os Estados Unidos tanto quanto a Europa e desconfie da eficiência de seus colegas latino-americanos.

O PT acabou?

Exauriu. Mas o humanismo petista ainda não se esgotou de todo entre os filiados. Engasgados até hoje por perderam a chance de fazer Patrus, Deda, Tarso Genro ou Jacques Wagner presidentes da República quando a direção permitiu que Lula levasse Dilma a fazer o que não gosta. É um dilema insolúvel da esquerda o autoritarismo de seus líderes e aparelhos. Depois surpreendeu a todos, petistas e não petistas, a simbiose esquerda-direita, com seu fisiologismo, paternalismo e clientelismo, tão presentes na aliança politico-econômica que Lula impôs aos governos do PT. A sensação é que não se ultrapassa a direita brasileira na corrido ao poder: ela está dentro da esquerda.

 

Lula tem condições de voltar?

Para o topo da elite pendurada no estado é o que parece mover os desejos dos que o impulsionam, como estamos vendo aí as consequências. Evidente que ele contribui para isto quando decide não aprender nada com exposições intelectuais. Mudando sua condição social, como faz questão de demonstrar que está mudando “como todos”, poderá até voltar, mas inconciliável com sua origem. E não estando sujeito a ilusões ou esperanças, voltar para quê ?

Quem é o líder da oposição?

Como as possibilidades e as circunstâncias da crise são coisas diferentes, a oposição tem se equilibrado entre esses dois polos. O senso de urgência chegou para todos com o agravamento das condições econômicas – as circunstâncias –, mas a inércia das disputas internas dos partidos – as possibilidades – está prevalecendo e impedindo surgir o rosto da transição. O fato real é que sem eleições gerais não é possível nem legítimo pensar em superar o PT. Se a transição for feita pelo impeachment tem que ter políticas do PT no novo governo para ele se estabilizar.

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