Em agosto, a Lei n.º 9.478, conhecida como Lei do Petróleo, completou 18 anos. A data da “maioridade” é propícia para analisarmos o que funcionou e o que não funcionou e propor soluções. Dedico este artigo a tratar do refino, que foi o segmento que destruiu expressivo valor da Petrobrás nos últimos cinco anos.
Em 2014, a empresa apresentou prejuízo de R$ 21,6 bilhões – e a área de Exploração e Produção (E&P) gerou lucro de R$ 32,3 bilhões. Mesmo se alocássemos todo o custo da área corporativa da Petrobrás (R$ 12,8 bilhões) em E&P, ainda assim a empresa teria apresentado expressivo lucro em 2014. Então, o que aconteceu?
A área de Abastecimento da Petrobrás, cuja principal atividade é o refino, apresentou em 2014 prejuízo (antes de impostos) de R$ 57,4 bilhões, gerado por write-off (baixa) de ativos e controle de preços de derivados. O write-off realizado foi de R$ 37,4 bilhões – e a interrupção de projetos em construção foi responsável por R$ 31 bilhões.
O controle de preços de derivados causou prejuízos não só em 2014, mas em todo o período de 2011 a 2014, durante o qual a área de Abastecimento acumulou geração de caixa negativa (Ebitda) de R$ 114,5 bilhões, sendo R$ 77,1 bilhões causados majoritariamente pelo controle de preços de derivados. Ao confrontarmos esses prejuízos com o ativo de Abastecimento (R$ 136,7 bilhões em dezembro de 2014), os números impressionam. Somente no período de 2011 a 2014, a Petrobrás investiu R$ 105 bilhões (US$ 52,9 bilhões) na área. Esses números alarmantes nos levam à seguinte agenda propositiva: como blindar o futuro e reparar o passado?
O relevante prejuízo apresentado pela área de Abastecimento da Petrobrás foi causado por contínua e expressiva falha em sua governança. A observância à Lei das S.A. e ao seu próprio Estatuto Social (muito diligente na atribuição das responsabilidades) por si só teria sido suficiente para evitar prejuízos. Entretanto, a interferência do governo na gestão ignorou o Estatuto Social da empresa.
O fato de a Petrobrás ter praticamente o monopólio do refino no País foi um incentivo para o governo usá-la para implementar política de preços a favor dos interesses do governo e contra os da empresa. Caso houvesse players relevantes privados, o controle de preços seria visto como quebra de regras, algo que causaria um impacto muito negativo ao País e ações nos órgãos de defesa da concorrência. Nos Estados Unidos, por exemplo, existem 165 refinarias privadas e, com isso, os preços seguem as regras de mercado.
A Lei do Petróleo refletiu o entendimento de que a desregulamentação de preços era fundamental para atrair investimentos para o segmento de refino e estabeleceu um período de transição, que terminou em dezembro de 2001. Com o objetivo de dar maior transparência e racionalidade à política de subsídios, a lei determinou acerto de contas entre a União e a Petrobrás relativo à conta petróleo, derivados e etanol até o fim do período de transição. Durante esse período, a política de preços seria definida pelo governo, por meio de uma fórmula paramétrica que calculava os preços de acordo com os do mercado internacional e a taxa de câmbio. Depois desse período de transição, novos subsídios nos preços de derivados deveriam ser submetidos ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e aprovados pelo Congresso Nacional. Fica claro que decisões do governo sobre política de preços da Petrobrás que por ventura prejudiquem a empresa e seus acionistas minoritários devem ser arcadas pelo governo, e não pela Petrobras.
No momento em que saudamos a volta aos cofres da Petrobrás de dinheiro oriundo da Operação Lava Jato, também seria necessário que o governo repusesse ao caixa da empresa as perdas da defasagem dos preços. Aí estaríamos verdadeiramente reparando o passado. Quanto a blindar o futuro, a forma correta seria vendendo refinarias e atraindo outros players para atuar no refino, além de o governo arcar com prejuízos que venham a ser causados por controle de preços.