O ciclo de reformas

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Em que pese o tiroteio político, o ciclo de reformas iniciado em 2016 prossegue. A aprovação, na Câmara dos Deputados, da nova lei de falências e do novo marco do gás revela a motivação para continuar transformando o país. Assim como a aprovação definitiva da nova lei do saneamento.

Agora, em um movimento ousado, o Congresso sugere avançar em duas reformas críticas para o país: a tributária e a administrativa. O que pode acontecer? Existem possibilidades de que ambas prossigam de forma consistente ainda neste ano? O certo é que as duas propostas despertam imensas resistências.

A reforma tributária tem na compensação aos estados — que perderiam com o novo imposto de valor agregado (IVA) nacional — um fator de grande discussão. Governadores querem contrapartidas que a equipe econômica não deseja dar. A tributação de serviços é outro tema em disputa. Mais um ponto de polêmica é a criação da contribuição sobre bens e serviços (CBS) a partir da unificação de PIS e Cofins.

Porém, com a retirada da urgência do projeto que cria a CBS, a tendência é que a proposta fique em segundo plano e a unificação dos tributos sobre o consumo seja tratada no contexto das emendas constitucionais, a reforma tributária ampla, que está sendo discutida em uma comissão mista (deputados e senadores) que deverá produzir um texto nas próximas semanas.

Com relação à reforma administrativa, que começa a tramitar na Câmara, haverá um longo caminho a trilhar. Rodrigo Maia, presidente da Casa, disse ser muito difícil que a reforma administrativa passe na frente da tributária. Com muita dificuldade, poderá ser votada, ainda em 2020, na Câmara dos Deputados.

A aprovação definitiva das duas reformas neste ano, no Congresso, é praticamente impossível. Além do debate complexo das duas propostas, existem disputas orçamentárias importantes, que vão predominar no semestre. Outras questões de repercussão fiscal serão definidas em votações de vetos presidenciais e pleiteadas na elaboração do Orçamento, que será votado no fim do ano. O Legislativo vai se movimentar para aumentar o volume de recursos que deverá ser executado de maneira impositiva. O Executivo, como se espera, vai resistir. Será uma grande briga política que vai testar a fidelidade e a consistência da base governista.

Outro ponto de dúvida está na posição dúbia do governo em relação à reforma tributária. O Executivo parece sinalizar que prefere o debate para o ano que vem.

Pretende definir o novo pacote de auxílio social a vulneráveis antes de se engajar seriamente nas reformas. E, por fim, ainda temos o processo eleitoral municipal, que impacta o debate e acirra a agenda municipalista. Agora, os partidos políticos estão mais empenhados na disputa visando a aumentar seus cacifes para a eleição presidencial do que em se desgastar arbitrando conflitos de interesse.

Lamentavelmente, o engajamento do setor privado no atual estágio do ciclo de reformas não é dos mais relevantes. Com razão, os empresários estão mais preocupados em manter a desoneração da folha de pagamento do que em apoiar uma reforma tributária que ainda não tem uma forma clara.

Publicado na Veja dia 11/09/2020. 

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