A tensão entre o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), e o presidente nacional do seu partido, o deputado federal Luciano Bivar (PE), cresce a cada dia.
Na última sexta-feira (11), Bolsonaro, através de seus advogados (Karina Kufa e Admar Gonzaga) e com a participação de 21 parlamentares do PSL, fez um pedido formal para que o comando nacional da sigla forneça documentos sobre as contas da legenda nos últimos cinco anos, incluindo os dados parciais de 2019.
O grupo de apoio incluiu: Alê Silva (MG); Aline Sleutjes (PR); Bia Kicis (DF); Bibo Nunes (RS); Carla Zambelli (SP); Carlos Jordy (RJ); Chris Tonietto (RJ); Coronel Armando (SC); Daniel Silveira (RJ); Eduardo Bolsonaro (SP); Filipe Barros (PR); General Girão (RN); Junio Amaral (MG); Guiga Peixoto (SP); Hélio Lopes (RJ); Luiz Ovando (MS); Luiz Philippe de Orleans e Bragança (SP); Márcio Labre (RJ); Ubiratan Sanderson (RS); e Major Vítor Hugo (MG). Participou do grupo o senador Flávio Bolsonaro (RJ).
Numa reação ao pedido de Bolsonaro, o comando nacional do PSL anunciou que pedirá uma auditoria nas contas da campanha presidencial do ano passado.
Nos bastidores, o que se diz é que o grupo de Bolsonaro quer encontrar argumentos jurídicos para que os deputados que desejam sair do partido não corram o risco de perder o mandato.
Além dessa narrativa, a investigação sobre a existência de supostas candidaturas “laranjas” que atinge diretórios estaduais do PSL, caso de Minas Gerais e Pernambuco, também é vista como um componente da crise atual.
Ao pedir uma auditoria nas contas do PSL via advogados do presidente, o grupo de Bolsonaro pode estar tentando se desvincular da questão dos “laranjas”, pois há investigações em curso que podem criar desdobramentos negativos para o comando nacional da sigla.
Mesmo que o PSL tenha se transformado num grande partido em função da eleição de Bolsonaro em 2018 para a Presidência e que haja pressão por mudanças na legenda, o poder sobre a burocracia partidária pertence a Bivar, que não deve ceder facilmente.
Como consequência, o entorno do presidente da República debate duas possibilidades para seu grupo: 1) fundar um novo partido, e já se fala na recriação da União Democrática Nacional (UDN); 2) realizar uma fusão com outras legendas.
Uma das variáveis que está gerando impasse na relação entre Bolsonaro e o comando do PSL é o fundo partidário.
Além da disputa por tais recursos, existe um debate jurídico sobre se os deputados que eventualmente deixarem o PSL para se filiar a outra legenda levarão consigo o direito de acesso ao fundo. Sem falar no risco de esses parlamentares perderem o mandato, caso deixem a sigla e a direção do PSL decida pedir na Justiça o mandato dos eleitos pela legenda.
Desde 2015, uma resolução do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que os deputados eleitos por um partido somente podem trocar de legenda sem perda do mandato nas seguintes situações:
1) mudança no programa partidário original da sigla pela qual foram eleitos;
2) grave discriminação política;
3) janela partidária (segundo a legislação eleitoral, o prazo-limite para troca ou filiação a um novo partido para ser candidato é de seis meses antes do pleito).
Assim, a eventual troca de partido por parte de deputados do PSL que queiram seguir o presidente Bolsonaro, caso ele realmente saia da legenda, corre o risco de ser judicializada.
Mesmo que os parlamentares aleguem, por exemplo, que houve “mudança no programa” do PSL, Bivar pode ingressar com uma ação no STF, já que o mandato pertence ao partido e não ao parlamentar.
Entretanto, uma ação movida pelo Rede Sustentabilidade que obteve parecer favorável da então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, questiona a reforma eleitoral de 2015, que estabeleceu a perda de mandato para quem se desfiliar do partido pelo qual foi eleito para criar uma nova sigla fora da janela partidária.
A questão do fundo partidário será item fundamental na decisão que será tomada por Bolsonaro e seu grupo, pois, diante da regra de proibição do financiamento empresarial, ter acesso ao fundo é determinante para a manutenção das campanhas eleitorais. E o PSL pretende apresentar um desempenho positivo nas eleições municipais de 2020, a primeira em que estará envolvido desde a eleição de Bolsonaro.
Fora o tema da fusão e do acesso ao fundo partidário, a divisão existente hoje no PSL colocou na agenda pautas como o impacto da crise no partido do presidente sobre a base aliada. Nos bastidores de Brasília comenta-se que, dos 53 deputados federais do PSL, apenas 20 estariam dispostos a trocar de sigla, por conta das incertezas jurídicas que a mudança acarreta.
Além disso, poderia haver uma divisão que traria dificuldades consideráveis para a base aliada. A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), e o líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO), tenderiam a ficar com Bivar. Já o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), seguiria Bolsonaro.
Dependendo do desdobramento da crise, poderemos ter um realinhamento das forças à direita do sistema partidário. Hoje, temos dois partidos considerados relevantes nesse campo: o próprio PSL e o Partido Novo.
A eventual troca de partido de Bolsonaro, além de construir, após muitos anos, um partido com viés assumidamente conservador, sobretudo nas pautas dos costumes, esvaziaria o PSL e reduziria o espaço do Novo.
O bolsonarismo, porém, corre o risco de ficar ainda mais isolado. Caso o presidente não consiga levar com ele um número expressivo de deputados do PSL, sua base pode ficar mais restrita.
Nesse cenário, quem tenderia a crescer seria o centrão, já que Bivar e parlamentares alinhados com ele possuem bom trânsito com as siglas centristas. Como consequência, o custo da governabilidade e do gerenciamento da coalizão ficaria mais alto.