Quem acompanha política no Brasil com certeza percebeu que nos últimos cinco anos a agenda do governo federal e do Congresso Nacional parece ter engatado no trilho de reformas amplas do Estado brasileiro. Primeiro, veio a Reforma da Previdência, a PEC que estabeleceu o Teto de Gastos e a aceleração do cronograma de privatizações. Agora, o governo tenta viabilizar as reformas administrativa e tributária.
O maior foco na agenda de racionamento dos gastos públicos remonta ao lançamento, em 2015, do documento Uma Ponte para o Futuro, cujos conceitos pautaram o governo Temer e, inevitavelmente, passaram a ser perseguidos também no governo Bolsonaro. Pelo menos no começo.
No centro do documento estão metas tanto políticas como econômicas: pacificação política, diminuição do crescimento da dívida pública, controle da crise fiscal, diminuição do juros, desindexação do orçamento público, orçamento impositivo e menor participação do Estado na economia.
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O MDB argumentava que, sem a concretização desses objetivos, o Brasil poderia entrar em uma grave crise que comprometeria a continuidade de programas sociais e a renda dos brasileiros.
“A Ponte para o Futuro foi uma contribuição exitosa da Fundação Ulisses Guimarães (FUG) para o Brasil enfrentar a mais grave crise econômica de sua história. Como presidente da FUG, coordenei as entrevistas com os mais experientes economistas, cientistas sociais e acadêmicos com vivência profissional no setor público para colher suas propostas de como superar a mais grave crise econômica e fiscal de nossa história”, conta Wellington Moreira Franco, Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência do governo Temer, em entrevista exclusiva ao Brasilianista.
Disputas políticas atrapalham as reformas
No começo do ano, assim que o novo coronavírus começou a mostrar seu potencial destrutivo, já era previsto que o foco da política brasileira seria redirecionado, com razão, para o combate à pandemia. Contudo, um outro elemento menos justificável parece estar desviando o foco do governo: as intrigas políticas, tanto as disputas entre ministros, como os embates dentro do Congresso Nacional.
As ideias permanecem as mesmas e sem unidade em torno delas não teremos reformas.
Moreira Franco
“E o que vemos agora é a repetição do que vimos ao longo do passado recente: a falta das condições políticas criadas e sustentadas por forças majoritárias para implementar um programa de mudanças negociado com elas. As ideias permanecem as mesmas e sem unidade em torno delas não teremos reformas”, avalia Moreira Franco.
“A pauta de avanços para formar uma maioria que a sustente não pode ser a pauta dos extremos ideológicos, da intolerância nem da provocação”, pontua.
Impopularidade ajudou Temer
Outro elemento que tem sido apontado como um freio para a agenda reformista é a possibilidade de reeleição. Bolsonaro, que começou dizendo que não tentaria um novo mandato, além de mudar de ideia, já tem redirecionado suas ações com objetivo de manter sua popularidade até 2022.
“Para o presidente Jair Bolsonaro, as pautas que interessam são as que contribuem para a construção do caminho que leve à reeleição. O que significa que todo cálculo político está sendo baseado no que pode ajudar ou ameaçar a sua campanha” aponta o cientistas político da Arko Advice, Murillo de Aragão.
O governo Temer tinha déficit de legitimidade, baixa popularidade e um programa de governo.
Moreira Franco
Para Moreira Franco, a impossibilidade de Temer se reeleger garantiu a ele o foco nas propostas do programa, mesmo quando eram consideradas impopulares. “O governo Temer tinha déficit de legitimidade, baixa popularidade e um programa de governo. Na minha opinião foi justamente a junção dessas três características que permitiram que o presidente se dedicasse à execução das propostas da Ponte e não a um projeto eleitoral. O governo Temer queria deixar como legado as reformas e não ser reeleito”, analisa o ex-ministro.
Objetivos não alcançados
Apesar de ter motivado pelo menos meia dúzia de reformas e projetos, diversos objetivos listados no documento Uma Ponte para o Futuro ainda parecem longe da realidade brasileira.
O primeiro objetivo listado é: “Construir uma trajetória de equilíbrio fiscal duradouro, com superávit operacional e a redução progressiva do endividamento público”. O terceiro é “alcançar, em no máximo 3 anos, a estabilidade da relação Dívida/PIB”.
Em 2020, 5 anos depois da publicação do documento, a relação Dívida/PIB não para de crescer e já passou de 100%.
A meta relacionada às privatizações avança, mas a passos curtos. A reforma tributária, que pretende simplificar a cobrança de impostos no Brasil ainda patina no Congresso.
Vale destaque para o último item da lista: “dar alta prioridade à pesquisa e o desenvolvimento tecnológico que são a base da inovação”. Disso, o governo está longe.
Contribuíram para esta matéria:
- Murillo de Aragão, CEO da Arko Advice e diretor do Brasilianista e
- Daniel Marques Vieira, editor do Brasilianista.