Com nossa miopia cotidiana e o olhar raso sobre a conjuntura, não observamos em detalhes o que nos cerca. Mas quem navega pelo ar ou pelo mar sobre o oceano Atlântico pode entender o conceito de Amazônia Azul, termo utilizado pela Armada para identificar nosso mar territorial.
A área conhecida como Amazônia Azul corresponde a 3,6 milhões de quilômetros quadrados e é equivalente à superfície da floresta amazônica. Seu potencial é imenso e, ao mesmo tempo, desconhecido. Mas apenas 0,5% dessa área é devidamente protegida na forma de parques marinhos.
Sabemos que nessa região temos pesca, recursos minerais no subsolo marinho, biodiversidade de espécies marítimas e petróleo, e que nela se concentra quase 90% da produção brasileira desse mineral.
Na verdade, sabe-se muito pouco sobre o que se passa por lá. Mas alguns poucos sabem que o futuro estará lá. Que existe muito mais. O mar é a última fronteira do Brasil a ser conhecida.
O país está entre os dez do mundo com maior plataforma continental. Estamos longe de aproveitar, por exemplo, a energia das marés e a energia eólica em alto-mar. Sem falar no potencial turístico ainda subaproveitado de nosso litoral.
Mas o mar que fascina tem dons que alucinam. Como disse o escritor italiano Giuseppe Lampedusa, em seu livro “O Senador e a Sereia” (LPM, Porto Alegre, 1980), “serão perigosos como todos os dons do mar, que dá a morte assim como a imortalidade”.
A infinita imortalidade da Amazônia Azul. O imenso azul traz reflexões. Paz e certa angústia. Admiração, desejo e temor. O querer conter em um abraço os mistérios do olhar que é mar.
A sereia Ligea, na história de Lampedusa, propunha ao senador, então jovem estudioso de grego, a solução da imortalidade: “Tu és belo e jovem; deverias seguir-me agora no mar e escaparias às dores, à velhice; viverias na minha morada sob os altíssimos montes de águas imóveis e escuras, onde tudo é silenciosa paz – que é tão intensa e tão arraigada que quem a possui nem ao menos percebe sua existência”.
O tempo passou. O senador esperou o final da vida com suas dores para ir ao encontro de Ligea e da imensidão de paz azul do Mediterrâneo.
O Brasil não deve esperar o fim dos tempos para se encontrar com seu mar. O nosso litoral é uma fonte inesgotável de riqueza. Mas não damos a devida atenção a seus recursos e potencialidades. Demoramos décadas para avançar na despoluição da baía de Guanabara.
Nem mesmo uma Olimpíada nos moveu para concluí-la. Somos brutalmente incompetentes em entender e dar a devida atenção – tanto sob a ótica ambiental quanto pelas óticas econômica e social – a nosso mar.
Algumas medidas devem ser adotadas. Uma delas é a criação de parques marinhos visando cumprir a Convenção de Diversidade Biológica, que entrou em vigor em 1993. E que conta com a adesão de 160 países. A convenção está fundada em três princípios: a conservação da diversidade biológica, o uso sustentável da biodiversidade e a repartição justa dos benefícios provenientes dos recursos genéticos.
De acordo com a convenção, da qual somos signatários, devemos ter, até 2020, 10% de nosso mar protegido por parques marinhos. Hoje, como disse acima, temos cerca de 0,5% de áreas protegidas. A criação de parques marinhos é uma grande oportunidade para o turismo e, até mesmo, para o fortalecimento de uma economia ambientalmente autossustentável. Cabe ao mundo político dar a devida importância ao tema.