Me engana que eu gosto: o multibilionário mercado das falsificações

Nápoles, frequentemente citada como a capital mundial das falsificações de marcas de luxo, é um epicentro onde anualmente milhares de artigos de luxo falsificados das marcas mais prestigiadas globalmente são apreendidos. Essa cidade italiana não só hospeda um vasto mercado de réplicas, mas também se tornou um símbolo do complexo desafio que as falsificações representam para a economia global e a propriedade intelectual.

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Na tentativa de educar os consumidores sobre as nuances entre autenticidade e imitação, empresários locais estabeleceram o “Museu do Verdadeiro e do Falso”. A iniciativa, apesar de bem-intencionada, teve uma duração breve, terminando suas atividades no ano passado. Esse fracasso reflete a complexidade e a profundidade do problema das falsificações, que está profundamente enraizado nas dinâmicas sociais e econômicas da região.

O mercado de falsificações de artigos de luxo é comandado pela Camorra, máfia napolitana, e tem o apoio de grupos chineses e turcos, e movimenta bilhões de euros na Europa, além de empregar alguns centenas de milhares no processo. A cadeia produtiva é complexa e, alguns vezes, apresentam elevado nível de sofisticação. Nos mercados turcos o consumidor é apresentado a bolsas falsificadas de marca com vários níveis de qualidade. Desde a réplica mal acabada até produtos muito semelhantes aos originais. Nas ruas da Itália, geralmente imigrantes ilegais vindos da África vendem cintos, bolsas, bonés falsificados para multidões de turistas.

Impressiona que, apesar da repressão das autoridades financeiras e policiais da Itália, o mercado só aumenta estimulado tanto pelo preço dos produtos vendidos e, ainda, pela aparente qualidade que ostentam. Qualquer lançamento novo da Louis Vuitton, Chanel, Gucci, Dior, Fendi é rapidamente copiado com vários níveis de qualidade. Inclusive com réplicas que somente aos olhos treinados de especialistas são identificadas como falsas.

Esse acontecimento nos leva a diversas reflexões. Citando Frank Lestringant, que escreveu sobre Montaigne e o Brasil, percebemos que muitas vezes nos contentamos com uma pequena parcela de verdade e uma ampla dose de ilusão. T.S. Eliot comentou que a humanidade não consegue lidar com excesso de realidade, optando frequentemente pela fantasia.

Comprar produtos de luxo falsificados é, em certa medida, mergulhar nessa fantasia. Significa não enfrentar a realidade de não poder adquirir o produto autêntico e ainda assim desejar mostrar aos outros que se está usando algo legítimo. É uma ilusão sobreposta a outra.

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Em 2022, o mercado global de produtos falsificados, que inclui bens identificados com “marcas espúrias indistinguíveis das registradas”, alcançou a impressionante marca de 4,2 trilhões de dólares, com artigos de luxo e moda compreendendo uma parcela significativa desse total. Uma pesquisa do SPC Brasil revelou que 69% dos consumidores brasileiros já compraram produtos falsificados, sendo o preço o principal motivador para essas aquisições.

O domínio deste mercado pelas mãos da Camorra, a máfia napolitana, com colaborações de grupos chineses e turcos, destaca a globalização do crime organizado que movimenta bilhões de euros. A persistência e o crescimento desse mercado, apesar dos esforços das autoridades financeiras e policiais italianas, são alimentados tanto pelos preços acessíveis desses produtos quanto pela qualidade surpreendentemente alta das réplicas. Itens de marcas como Louis Vuitton, Chanel, Gucci, Dior e Fendi são rapidamente copiados, com réplicas que enganam até mesmo especialistas.

Esta realidade nos provoca a refletir sobre a nossa própria relação com a verdade e a autenticidade. Como apontado por Frank Lestringant em suas observações sobre Montaigne e T.S. Eliot, frequentemente nos contentamos com uma versão diluída da verdade, optando por uma confortável ilusão. A aquisição de produtos de luxo falsificados exemplifica essa escolha: é uma tentativa de adquirir status e prestígio sem os custos associados, uma aceitação de falsidade que satisfaz desejos superficiais.

Em 2022, o mercado global de produtos falsificados alcançou a impressionante marca de 4,2 trilhões de dólares, destacando-se especialmente a indústria da moda de luxo como um dos segmentos mais afetados. Essa cifra alarmante não apenas sublinha a magnitude do comércio ilegal de bens de consumo, mas também evidencia a crescente demanda por produtos de luxo a preços acessíveis. No Brasil, uma pesquisa indicou que 69% dos consumidores admitiram ter adquirido produtos falsificados, sendo o principal motivador o preço reduzido desses itens. Esse dado revela não somente a prevalência das falsificações no mercado, mas também destaca a urgência de fomentar uma maior conscientização entre os consumidores e a implementação de regulamentações mais rigorosas.

Consequentemente, a questão das falsificações de produtos de luxo, que continua a prosperar, nos convoca a uma reflexão crítica não só sobre as estratégias legais e regulatórias destinadas a combater essa prática, mas também sobre o comportamento de compra do consumidor. A batalha contra a pirataria de produtos não se restringe apenas à eficácia da aplicação das leis; ela engloba também a necessidade de educar os consumidores sobre as consequências econômicas e sociais de suas escolhas de compra.

Além disso, é essencial reavaliar nossos valores sociais relacionados ao consumo e à autenticidade. A valorização excessiva de marcas e o status associado ao consumo de produtos de luxo alimentam o mercado de falsificações. Portanto, promover uma mudança cultural que valorize a originalidade e a ética no consumo pode ser tão importante quanto o reforço legal.

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Em suma, enquanto o fenômeno das falsificações continua a se expandir, enfrentamos o desafio de desenvolver uma abordagem multifacetada que envolva tanto a fortificação das medidas legais quanto o incentivo a um consumo mais consciente e ético. A luta contra as falsificações é complexa e exige uma cooperação ampla entre governos, empresas, consumidores e comunidades globais para ser efetiva. Através dessa colaboração, podemos aspirar a um mercado mais justo e transparente, onde a autenticidade é valorizada e protegida.

Considerando o baixo interesse da população no tema da repressão às falsificações, a incapacidade das autoridades em lidar com um mercado crescente e que conta com o amparo da sociedade que consome os produtos sem culpa e a capacidade tecnológica cada vez maior de produzir falsificações, já vivemos uma época onde a circulação de produtos falsificados será muito maior do que a dos produtos de marca verdadeiros.

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