Cheguei aqui, e você tem que lidar comigo, diz o clima para a Terra, certo de que as pessoas só desconfiam dos passos em falso que dão na vida quando as coisas se tornam salientes. Estamos em plena era da impostura, a ideologia dos sem-programa competindo com o programa dos sem-ideologia.
Sobre clima, todo exagero é verdadeiro; toda verdade, um exagero. Na confusão, o calor aumenta; o gelo derrete.
Eis que Donald Trump chega à Presidência dos EUA, mas é Al Gore, ex-futuro-presidente do país — que venceu George Bush, mas não ocupou a Casa Branca — que faz outra vez o papel do bobo bom. Reaparece em novo documentário “Uma sequência inconveniente: a verdade ao poder”, alertando que o aquecimento é um esgoto que adoece a Terra.
O bobo é aquele personagem tragicômico do teatro clássico, inspirado no funcionário das cortes familiares contratado para divertir o rei. Sem papas na língua, era autorizado a dizer o que lhe vinha à cabeça.
Figura interessante que faz falta aos partidos políticos brasileiros, nossas monarquias fósseis que não consideram a inteligência um bem renovável.
Bobo é quem estuda e fala com o coração verdades percebidas pela razão, jogadas pela maioria para debaixo do tapete.
Al Gore, um tipo alma penada, orgulha-se do papel que teve para viabilizar o acerto sobre o clima. Se fosse cumprido, o mundo poderia manter dois graus abaixo o aumento da temperatura.
EUA se retira do Acordo de Paris
Trump quer enterrar o Acordo de Paris, celebrado em 2015 na COP-21, conferência do clima, e do qual espalhafatosamente retirou os EUA meses atrás.
Não que ele ligue, mas não será convidado por Macron, o presidente da França, para o encontro na semana que vem que tenta realinhar líderes mundiais em torno do tratado.
Em antecipação a isso, o “Le Monde”, o principal jornal francês, traz manchete em letras garrafais: “Em breve já será muito tarde”. Era a chamada para um documento assinado por 15 mil cientistas de 184 países alertando para a urgência de ações para evitar “uma miséria generalizada com a perda catastrófica de biodiversidade”.
As previsões endossadas por Gore são fins da utopia, nascidas da compreensão dos malefícios oriundos do aquecimento do planeta, por quaisquer dois graus que sejam. Faz cada vez mais sentido perceber na pele por que o mundo voltou a esquentar.
Onze anos se passaram desde que “Uma verdade inconveniente”, documentário de Davis Guggenheim, com um apaixonado Al Gore, alertava para o aquecimento global contínuo.
De pouco adiantou o impacto que foi receber o Oscar de melhor documentário e, junto com o Painel Intergovernamental Para As Mudanças Climática Da ONU, o Prêmio Nobel da Paz de 2007.
Quem quer salvar a Terra da morte do clima?
O resumo dos anseios ecológicos é que temos que adotar um modo de vida melhor. Para evitar morrer de calor, não adianta somente parar a emissão, mas desenvolver tecnologia para sugar o equivalente a 20 anos de emissão de gás tóxico. Mas quem quer mesmo salvar a Terra da morte do clima?
Os Estados Unidos estão na condição de o único país do mundo que oficialmente rejeita o acordo. Uma posição inconveniente de um governante do qual muitos acham graça. Al Gore é o chato, mas o mais errado, Trump, não é nenhum bobo da corte.