Quando o senador Aloysio Nunes foi anunciado como a nova cara do Itamaraty, poucas pessoas se surpreenderam em Brasília. O mesmo pode ser dito da carta de José Serra pedindo demissão do cargo. Desde novembro, importantes interlocutores do ex-ministro já deixavam claro que sua saída era iminente.
No dia 13 de dezembro, por exemplo, em um almoço com 12 diplomatas estrangeiros e dois brasileiros no restaurante Rubayat, em Brasília, os representantes do Itamaraty já admitiam que, com a saída de Serra, Aloysio Nunes seria seu substituto. (Eles também lamentavam a morte do ex-ministro de Relações Exteriores Luiz Felipe Lampreia, ocorrida em fevereiro. Seria o nome ideal, segundo comentaram no encontro.)
Faltava apenas definir o ritual. Os problemas de saúde de Serra foram, sim, a principal razão para o desligamento, mas não se deve descartar o fato de que ele não encontrou no Itamaraty uma casa que se adequasse ao seu estilo.
A escolha de Aloysio Nunes, que tomou posse na manhã desta terça-feira (7), já vinha sendo cogitada desde o momento em que a possibilidade de desistência de Serra tornou-se concreta. Com uma atuação constante e destacada na Comissão de Relações Exteriores do Senado, Nunes tornou-se um nome óbvio entre os políticos. Então, bastava o presidente Michel Temer escolher a solução: seria um político ou um técnico (diplomata)?
Obviamente, Serra teve voz decisiva na escolha de Nunes, e isso indica que haverá uma continuidade de ideias, mas uma profunda diferenciação de estilos.
As propostas de política externa do PSDB são relativamente padronizadas:
1. Repúdio constante e profundo a tudo o que se enquadra no espírito “bolivariano”, tendo a Venezuela como exemplo máximo do fracasso socialista no continente.
2. Foco no comércio exterior e em alianças que gerem recursos e investimentos para o país.
3. Ênfase nos maiores mercados: EUA, UE, China, Índia, diferentemente na visão minimalista e coletivista do governo Lula.
4. Alívio na obsessão amorinista de assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, por mais que isso siga sendo sempre um norte para o Itamaraty.
5. Aproximação com países que cultivem uma definição de democracia tão fácil que dispense malabarismo teórico para justificá-la.
O estilo pessoal de Aloysio Nunes trará uma forma mais suave e menos centralizada na operacionalização das visões descritas acima. Enquanto Serra, por mais brilhante que seja, possui menor interação com o tradicionalismo do Itamaraty, Nunes estará mais disposto a se integrar aos hábitos itamaratianos e assim para aumentar as chances de desfrutar uma passagem por ali mais profunda e relevante do que Serra teve. Para que isto funcione, o senador paulista deverá observar os seguintes aspectos:
1. O presidente Temer é um governante doméstico, de pouca exposição externa. A política externa não é prioridade para o seu governo (erro estratégico de Serra ao trabalhar com tal hipótese).
2. O Brasil busca credibilidade, manutenção das posições históricas e atração de investimentos. Não existe Ministério melhor para que Aloysio Nunes consiga atingir tal objetivo.
3. Comparativamente, o nível e a capacidade individual da equipe do Itamaraty seguem sendo muito superiores aos de outros Ministérios (talvez somente a Defesa e a Fazenda se equiparam).
4. Discrição no Brasil e objetividade e força no exterior. Serra errou ao tentar trazer o Ministério para diversos temas que não são de sua alçada.
5. A força do Itamaraty está em sua estrutura e na disciplina de seu corpo funcional. Protocolos internos devem ser seguidos para evitar boicotes externos. Em Brasília, quando um Ministro rejeita os protocolos internos do Itamaraty, ouve-se o som da frigideira sempre que seu nome é mencionado.
6. O Mercosul deve ser uma união aduaneira, não uma zona de livre comércio.
O grande risco que um ministro político no Itamaraty corre, é cair na irrelevância. Espero que Aloysio Nunes desvie-se desses perigos e mostre-se o senador enérgico durante seus anos de presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado.
O Brasil precisa saber como quer ser visto no exterior. Historicamente, sempre fomos muito fortes nas arenas multilaterais e menos objetivos e disciplinados nas relações bilaterais.
Assim como a Defesa, trata-se de um Ministério de Estado, não apenas de governo. Durante a era petista, foi um órgão de partido, e isso deve ser sempre lembrado para que volte aos anos de relevância não apelativa que o tornou respeitado no mundo inteiro.