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PEC dos Precatórios e o direito de propriedade no Brasil – por Alexandre Aroeira Salles

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Senhoras e senhores congressistas, cidadãs e cidadãos, imagino que alguns estejam com sérias dúvidas sobre a discussão da PEC dos Precatórios, perguntando-se: seria acertado adiar (mais ainda) o pagamento de dívidas governamentais (transitadas em julgado) para driblar o sistema do Teto de Gastos, com alegada finalidade de destinar os R$400,00 a milhões de pobres inocentes brasileiros?

Todos os leitores já devem saber o que são os tais Precatórios: direitos de propriedade reconhecidos pelo Poder Judiciário que, no passado, foram expropriados/desrespeitados pelo Estado brasileiro. Normalmente o cidadão, a cidadã ou a empresa que recebe tais precatórios, precisou esperar dez, quinze, vinte anos para ver reconhecido pelo judiciário o seu direito de propriedade “quase” perdido.

Igualmente, o leitor já entendeu o que significa o Teto de Gastos: regra constitucional de responsabilidade fiscal, que proibia o Governo Federal de gastar continuamente mais do que os valores de arrecadação previstos na lei orçamentária, a fim de dar à sociedade a garantia de que o Governo não viria a se tornar insolvente, ou seja, incapaz de pagar aos cidadãos e às empresas as quantias que lhes devia.

Pois bem, com a tal PEC dos Precatórios, o Poder Executivo e o Congresso Nacional conseguiram um milagre: derrubaram com uma única tacada dois pilares fundamentais para o desenvolvimento social e econômico, o direito de propriedade e a responsabilidade fiscal.

Vou lhes dar aqui um ângulo de abordagem que não tenho visto nas análises dos políticos que pode servir para ajudar no entendimento do tema. Existem milhões de pobres e miseráveis no Brasil porque:

  • Não há trabalho para eles.
  • Não há trabalho porque não existem empresários suficientemente dispostos a abrir novas empresas ou a expandir seus negócios por essas bandas de cá.
  • Isso acontece porque aqueles que têm dinheiro disponível para investir/empreender não se sentem seguros de que tais investimentos serão respeitados.
  • A chance de haver desrespeito ao investimento realizado decorre do fato de o Direito de Propriedade no Brasil ser muito, muito, muito fraco. Para se ter uma ideia, entre 180 países analisados pela 2021 Index Economic Freedom, o Brasil pontua apenas 55 pontos, entre 100 distribuídos, nos colocando na vergonhosa 143º posição, muito atrás da Nova Zelândia e da Austrália, com 91 e 81 pontos, 2ª e 3ª posições, respectivamente. Veja que o Brasil, em sua 143º posição está à frente apenas de países como Camarões, Equador, Etiópia e Paquistão.
  • Se o Direito de Propriedade é fraco, então é recomendável que o investidor brasileiro encontre métodos seguros para proteger a sua poupança, normalmente em alguma aplicação financeira tida como segura, ainda mais se essa aplicação estiver em países que respeitam os seus direitos.
  • Se o investidor for um estrangeiro, ele acaba preferindo investir seus milhões de dólares em países onde o Direito de Propriedade é respeitado, como, por exemplo, nos EUA, Canadá, Austrália, Reino Unido, Irlanda, Holanda, Alemanha, Espanha, Portugal, Áustria, Israel, Coréia do Sul, Japão, Cingapura e Nova Zelândia.

Se o silogismo acima estiver correto (como acredito esteja), a decisão do Governo e do Congresso Nacional de promulgar a PEC dos Precatórios é horrorosa para o presente e o futuro de todos os brasileiros, sejam pobres ou ricos. Típico atalho que nos manterá, cada vez mais e de forma inevitável, no triste buraco dos países sem credibilidade, normalmente ocupados pelo grupo dos chamados de subdesenvolvidos.

Tudo isso se agrava quando se sabe que haveria muitas outras formas e mecanismos legítimos e racionais para se liberar do orçamento os bilhões de reais necessários para o auxílio aos necessitados brasileiros, como revisão de despesas de custeio, emendas parlamentares, com abono salarial, seguro-defeso, seguro-desemprego, subsídios fiscais.

Não mudaremos de patamar como nação mantendo os erros de sempre, fragilizando a segurança jurídica, o direito de propriedade, a coisa julgada e os direitos adquiridos.

* Alexandre Aroeira Salles é doutor em Direito e sócio fundador da banca Aroeira Salles Advogados

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