Precatórios: Decisão de fatiar PEC gera impasse no Congresso

Senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) junto ao presidente da Câmara, deputado Arthur Lira. Foto: J. Batista/Câmara dos Deputados

Em entrevista coletiva concedida após a aprovação da PEC dos Precatórios pelo Senado Federal, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), anunciou que vai fatiar a proposta. Assim, os trechos consensuais entre Câmara e Senado serão promulgados e já devem começar a valer, enquanto trechos alterados pelos senadores dever aguardar a análise dos deputados.

Segundo Lira, o calendário de tramitação só vai permitir que as mudanças feitas pelo Senado sejam votadas em 2022. “Nós vamos ver o texto comum das duas Casas. O que não for comum terá que ir para a CCJ, e para a comissão especial por dez sessões, no mínimo, e depois vir a Plenário. Então, eu não creio que este ano o que não for comum possa ser votado”, disse.

Contudo, se o Congresso Nacional der prosseguimento à ideia de Arthur Lira de fatiar a PEC dos Precatórios, o governo pode enfrentar alguns problemas. Na forma que foi aprovada no Senado, a PEC cria dificuldades para que o desmembramento ocorra.

No artigo que cria o subteto para pagamento dos precatórios, as alterações feitas pelos senadores para amarrar o espaço fiscal a gastos sociais, foram inseridas logo no caput – texto principal, antes de parágrafos e incisos. Assim, na avaliação de senadores experientes, seria impossível cortar e promulgar somente metade do texto do artigo. Se Lira submeter somente os trechos alterados a uma nova tramitação na Câmara, a PEC seria promulgada sem a previsão de um limite para pagamento de dívidas judiciais. Assim, 2022 começaria com o governo tendo a obrigação de pagar os precatórios em sua totalidade

“Se eles quiserem promulgar apenas os trechos que concordamos, ótimo, porque o que não concordávamos, jogamos tudo no mesmo artigo. Caiu securitização – se for devolvido ao texto tem que passar por nós de novo. Antecipamos para 2026 o fim do subteto, e nesse mesmo artigo estabelecemos que o espaço fiscal vai todo para seguridade social e Auxílio Brasil. Se ele não promulgar isso, para nós é indiferente porque não teria subteto e nós não queríamos subteto” explica a senadora Simone Tebet, que teve papel central na negociação das alterações feitas no Senado.

Segundo Tebet, o único trecho que dá espaço para uma promulgação fatiada sem gerar problemas para o governo é a vinculação do espaço fiscal a ser aberto pela mudança na forma de cálculo do Teto de Gastos. “ O único ponto que deixamos solto, e foi proposital, foi a alteração na forma de cálculo do Teto Fiscal. Mas isso só abre espaço fiscal para pagar o Auxílio até janeiro. Estou confortável que não vai faltar dinheiro para as famílias que estão passando fome e também porque nossas exigências ou são atendidas na íntegra ou ele não consegue avançar na promulgação pela metade”, explica.

Desconforto político

A fala de Lira também gerou desconforto político dentro do Congresso Nacional. A avaliação é de que houve alguma comunicação cruzada que pode ter confundido a negociação. Isso porque a decisão de Lira seria para agradar o governo, ao mesmo tempo que os trechos alterados no Senado foram negociados com a participação do líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

Para o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), um dos principais articulares do entendimento, o episódio fortalece as desconfianças entre as duas casas.

“Não é de hoje que temos desconfiança entre acordos entre a Câmara e o Senado. Espero que o próprio presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), não promulgue o texto. Ainda depende dele. Ele que é o presidente do Congresso. Ali não se publica nada sem haver o entendimento entre os dois”, declarou.

O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (Sem Partido-RJ), chegou a publicar nas redes sociais de que os senadores de esquerda haviam sido enganados pelo governo.

Em busca de opções

Diante das dificuldades técnicas de promulgação fatiada, está sendo cogitada a possibilidade de sugerir ao presidente da Câmara, Arthur Lira, a apensação da PEC a uma outra que já esteja na Câmara para que ela possa ser votada diretamente no plenário, sem ter que passar por comissões.

O ministro João Roma conta com a promulgação parcial da emenda e espera uma definição até segunda-feira (6) para que ele possa iniciar os pagamentos já na próxima semana.

O que mudou

Durante a tramitação no Senado Federal, alguns pontos da PEC foram alterados. Ainda na CCJ, foi incluída, por exemplo, a proposta de transformar o Auxílio Brasil em uma política pública permanente. O relatório também vincula o valor do espaço fiscal a ser aberto pela PEC ao programa social, às despesas relacionadas ao salário mínimo, à desoneração da folha de pagamentos e a outros gastos.

O texto foi costurado de tal forma a evitar que o espaço fiscal a ser aberto seja de formas não descritas na PEC, o que poderia dar vantagem a Jair Bolsonaro na corrida eleitoral. O presidente chegou a falar em usar a PEC para dar reajuste para servidores públicos. Senadores também temem que o espaço seja utilizado para liberação de emendas parlamentares.

O texto aprovado no Senado também propõe que o pagamento dos precatórios do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) não estejam submetidos ao Teto de Gastos.


Postagens relacionadas

Câmara aprova PL que flexibiliza regras de licitações em casos de calamidade pública

Nesta semana, STF deve julgar regras sobre investigação de acidentes aéreos

Morre Delfim Netto, aos 96 anos; ex-ministro foi um dos signatários do AI-5

Usamos cookies para aprimorar sua experiência de navegação. Ao clicar em "Aceitar", você concorda com o uso de cookies. Saiba mais