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Licenciamento ambiental não vai nocautear o Senado, defende vice-presidente da Casa

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Aprovado na Câmara no último dia 13 de maio, o Projeto de Lei que altera regras de licenciamento ambiental deve ser tratado com maior cautela no Senado. É o que defende o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), vice-presidente da Casa. Segundo ele, o projeto de lei, que estava parado desde 2004 na Câmara, foi resgatado e votado às pressas.

Usando o boxe como metáfora, ele diz que a oposição foi pega de surpresa. “Se você está preparado e vê que seu adversário vai te golpear no fígado, você protege com o braço baixo. Quando você é pego desprevenido você é levado à lona. Então a oposição foi levada à lona porque imaginava que o procedimento se daria com respeito pelo que regimentalmente é previsto. Foi nocauteada”, explica. Mas deixa um aviso: “Nós [senadores] não vamos ser nocauteados. Nós fomos advertidos”.

Veneziano também avalia que a operação recente da Polícia Federal contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Sales, ajudou a alertar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), quanto à necessidade de que se faça um debate mais aprofundado sobre o licenciamento ambiental. “Se ele trouxesse a matéria diante de tudo que a gente está fazendo e constatando ele iria colocar uma mancha no seu currículo, que é um currículo digno de todo nosso reconhecimento”. 

Críticas a Lira, elogios a Pacheco

De acordo com Veneziano, a manobra para que o projeto de lei fosse votado rapidamente na Câmara deve-se ao alinhamento entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e o presidente Jair Bolsonaro, de quem recebeu apoio durante a eleição da Mesa Diretora da Câmara. Questionado se o mesmo não valeria ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que também teve o aval de Bolsonaro, o senador estabelece uma diferença:

“Há uma diferença considerável entre ser aliado de Bolsonaro e ter recebido apoio de Bolsonaro”, diz, defendendo que Pacheco se elegeu por conta do apoio do ex-presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). “Ele se fez viável a partir dessa sugestão e de uma capacidade que tem de bem tratar, relacionar-se e articular junto aos companheiros”, elogia.

CPI da Pandemia

Vice-presidente do Senado, Veneziano não acredita que a CPI vá gerar grandes consequências ao governo. Isso porque, na avaliação dele, a investigação tem se focado no uso de cloroquina. “Na hora em que o relatório final trouxer sugestões de indiciamentos, vai dizer que até determinado momento da pandemia havia ainda estudos sendo desenvolvidos a respeito da eficácia ou não do kit profilático. Então quem até aquele instante prescrevia esses medicamentos estaria salvaguardado porque não havia uma prova inconteste absoluta da sua ineficácia”, avalia.

Por outro lado, ele pontua dois assuntos que devem gerar maior repercussão: a omissão na compra de vacinas e a crise do oxigênio em Manaus. “O dolo está exatamente quando você, como sujeito ativo, assume o risco eventual. As autoridades públicas nacionais em certas ocasiões assumiram esse risco”.

Confira a entrevista completa:


Está em debate no Senado um PL que faz mudanças no licenciamento ambiental. Ambientalistas dizem que pode aumentar a degradação ambiental. Sei que o senhor é um crítico desse projeto, mas você acredita que ele deve ser alterado ou descartado?

Nós não abdicaremos de fazer o debate sobre qualquer assunto. Agora, a proposta foi discutida na Câmara depois de um longo período parada. O projeto é 2004. De uma hora para outra ele voltou. Na verdade, não foi de uma hora para outra. Voltou para atender a uma política que, ao meu ver, é extremamente inoportuna e violentamente atentatória à sustentabilidade ambiental. 

O presidente resgatou esse tema e, de maneira precipitada e inconsequente, ele foi votado e aprovado com pontos que podem gerar prejuízos abomináveis e que cujas consequências serão imprevisíveis e impossíveis de se consertar. 

O que nós queremos é fazer um debate onde todos possam falar. Quando eu falo todos, incluo as entidades, governos estaduais, as autoridades sobre sobre o assunto, para que não prevaleça apenas a versão do governo. 

Da maneira que está lá, há uma licenciosidade, onde o subjetivismo vai prevalecer. Com aquele novo instituto da autodeclaração, o interessado vai poder dizer “aqui eu não preciso de licenciamento ambiental porque o impacto é de baixíssima monta”. 

Em um Brasil onde você desaparelha os órgãos de fiscalização, como é o caso do Ibama, como se diz aqui na Paraíba, vai “correr frouxo”. Vai acontecer como aconteceu agora esse crime absurdo perpetrado com os olhos oficiais da exportação do contrabando de madeira em um volume colossal. 

Precisamos fazer esse debate. Quer discutir? Então discutamos! Não podemos virar as costas, fechar os olhos diante de um projeto que vai trazer um prejuízo gigantesco, até mesmo para aqueles que se acham beneficiados. Como nós estamos no mesmo ambiente global, outros países tornarão o Brasil um parea. 

O senhor vê esse pensamento entre os demais senadores?

Tenho sim. Uma boa parte dos senadores com quem eu falei compartilha esse pensamento. O presidente da Comissão, por exemplo, que é o senador Jaques Wagner, uma pessoa muito equilibrada, que não ideologiza o tema. Eu falei com pelo menos 30 companheiros que acreditam que esse debate prévio precisa ser promovido.

Eu pergunto isso porque na Câmara passou muito facilmente. Dá a impressão de ter muito apoio.

Lá passou muito rápido. Mas vai dentro daquela lógica estabelecida na relação constituída entre o presidente da Câmara e o Presidente da República. A lógica é de passar matérias que, em momentos de normalidade, teriam um procedimento legislativo cauteloso e equilibrado, seriam vencidas as etapas, com discussão das comissões e instalação de Comissão Especial. Mas Lira tem uma agenda que converge com os interesses do Presidente da República também no quesito meio ambiente. Essa forma de avançar, diminui a própria capacidade de reação. Imagine metaforicamente dois adversários que estão uma disputa esportiva. Se você está preparado e vê que seu adversário vai te golpear no fígado, você protege com o braço baixo. Quando você é pego desprevenido você é levado à lona. Então a oposição foi levada à lona porque imaginava que o procedimento se daria com respeito pelo que regimentalmente é previsto. Foi nocauteada. Nós [senadores] não vamos ser nocauteados. Nós fomos advertidos porque veio primeiro da Câmara.

Também pesa essa operação recente da PF contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles?

Não posso deixar de registrar que foi fundamental que esse episódio viesse a lume para que o próprio presidente Rodrigo Pacheco tivesse consigo a segurança de não levar adiante essa matéria. Se ele trouxesse a matéria diante de tudo que a gente está fazendo e constatando ele iria colocar uma mancha no seu currículo, que é um currículo digno de todo nosso reconhecimento. Esses episódios são clamorosos, absurdos. O que o atual ministro em conluio com os seus assessores subservientes, e com aqueles que se tornaram subservientes, como o presidente do Ibama, fez conosco, com o Brasil, nos deixa desmoralizados. Até porque a prova desse envolvimento é facílima de ser obtida. Todo esse material que foi contrabandeado com a proteção do Ibama e, portanto, do próprio Ministério, encontra-se detido nos Estados Unidos. Não tem como negar.

O senhor disse que a rapidez com a qual o projeto passou na Câmara deve-se à proximidade entre Lira e Bolsonaro. No Senado, a situação não deve se repetir? Pacheco também foi apoiado por Bolsonaro.

Há uma diferença considerável entre ser aliado de Bolsonaro e ter recebido apoio de Bolsonaro. Não vou me adentrar na discussão sobre os procedimentos que o Planalto tem na sua articulação, mas o presidente concentrou-se quase que por completo no trabalho na Câmara. No Senado apoiou Rodrigo Pacheco por ver que, ele sendo eleito, não seria uma presença indigesta. Mas Rodrigo constituiu-se na condição de candidato primeiro por força de ter sido o candidato defendido publicamente pelo presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP). Ele se fez viável a partir dessa sugestão, da apresentação e do pleito que foi feito por Alcolumbre aos seus pares; De uma capacidade que tem de bem tratar, relacionar-se e articular junto aos companheiros. Eu estou entre esses – o conheci na Câmara de Deputados. 

Há uma distante relação entre a participação do governo e do presidente da República na eleição de Arthur Lira do que aconteceu no Senado. O Senado definiu o seu futuro condutor por iniciativa própria.

O que o senhor pensa sobre a MP da Eletrobrás, que também chegou ao Senado recentemente?

Da mesma maneira como eu fiz as observações sobre o projeto de licenciamento, a Medida Provisória da Eletrobras não poderia passar. Mas vai depender da disposição do presidente em pautá-la. Ela está com prazo para expirar dia 26 de julho. O Presidente tem ouvido todos os dias companheiros alertarem para a necessidade de que ela precisaria passar por um debate muito maior. Na Câmara, pontos foram levantados e setores direta ou indiretamente ligados, mas principalmente estudiosos do setor energético, mostraram problemas graves e consequências que poderão advir desta aprovação. A primeira delas, que é a mais imediata, é a questão dos custos, que dizem respeito aos milhões de brasileiros, principalmente aqueles que já se encontram em uma situação depauperada. 

Mas você tem outra consequência gravíssima, que é a de transferir o controle de um setor estratégico, como é o da energia, a outras mãos. Ao meu ver é um crime contra a nação que o Estado deliberadamente abra mão de algo que o dá força na geopolítica mundial. 

Perdendo esse controle, vamos perdendo soberania e o setor energético, que nos cobra políticas avançadas, não pode sair das mãos do Estado. Ele pode melhorar o seu gerenciamento, a sua administração, ele pode colher investimento, mas sou diametralmente contrário à ideia de que ele perca o controle. Eu propus audiências, uma na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR) e uma na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Eu espero que o presidente, que ainda não se pronunciou, que ele não paute de  última hora porque vai gerar um inconformismo diante de tudo que tá sendo posto. 

Então o entendimento majoritário no Senado é de que a MP passe por comissão?

Olha, o apelo que nós estamos fazendo é esse. Eu creio que a postura do Presidente Rodrigo Pacheco é muito mais comedida e muito mais responsável em relação aos interesses nacionais, diferentemente do presidente Arthur Lira. Tenho muito respeito por ele, mas ele ficou muito mais atrelado aos interesses do Planalto do que o presidente do Senado. Acho que o presidente Rodrigo Pacheco, que é um cidadão de altíssima formação, que tem alcance para saber o significado e as consequências disso, tem autoridade para dizer ‘ela pode expirar, mas não vai passar dessa forma’.

Imagine abrir mão de um bem nacional como esse, que repercute em todas as nossas regiões. Afinal de contas, você está tratando de uma holding abrangente, e vai colocá-la para negociação em um momento de pandemia. Isso também é contrário à lógica. Eu guardo essa expectativa, do seu Presidente Rodrigo, por não ter sido eleito pela força e a benção do presidente da República, que ele tenha essa condição e a autoridade de dizer “pera lá!”. Que ele não vai se omitir, mas não vai empurrar essa MP goela abaixo.

O que o senhor está achando da CPI? Ela está atingindo o objetivo? Ela deve mudar de foco com a convocação de governadores?

Nós não sabemos nem se os governadores realmente irão. Eu tomei conhecimento de que iria ser questionada essa convocação. Então não dá para falar sobre hipóteses. Se realmente eles tiverem a salvaguarda do Supremo, o que falar sobre algo que não vai acontecer? 

O que eu tenho dito quando me fazem essa pergunta, é que é importante que os integrantes, que têm mais experiência que eu, que eles não permitam que o instrumento da CPI se desnature e se desgaste ainda mais perante a opinião pública. A opinião pública em geral hoje, o que se comenta, é de que a CPI não vale nada, não dá em nada. Então se essa comissão não trouxer algo palpável, sólido, consistente, que justifique a sua instalação, vai ser muito ruim para futuras possíveis CPIs. 

A estratégia do governo é muito clara através dos seus integrantes, defensores da tese da cloroquina: na hora em que o relatório final trouxer sugestões de indiciamentos, vai dizer que até determinado momento da pandemia havia ainda estudos sendo desenvolvidos a respeito da eficácia ou não do kit profilático. Então quem até aquele instante prescrevia esses medicamentos estaria salvaguardado porque não havia uma prova inconteste absoluta da sua ineficácia. Nessa linha eu não acredito que a acusação vá levar a resultados efetivos e práticos. 

O que me parece inevitável é a constatação das omissões. Inevitavelmente os indiciamentos serão sugeridos por conta das omissões ocorridas, culposamente e também com o elemento subjetivo do dolo. O dolo está exatamente quando você, como sujeito ativo, assume o risco eventual. As autoridades públicas nacionais em certas ocasiões assumiram esse risco. O episódio do Amazonas é muito claro. O episódio das campanhas do não uso das medidas restritivas também é muito claro. A omissão, a negligência, quando o governo deixou de articular a compra das vacinas mesmo tendo a oportunidade para fazê-lo,  também me parece muito claro. Não obstante eles vão se agarrar na tese de que não poderiam contratar porque havia nos contratos cláusulas draconianas.

Vai ficar entre a afirmação e a defesa deles de que queriam fazer mas não nos moldes sugeridos pelos laboratórios e, pelo lado acusador, de que naquele instante mesmo com alguma cláusula discutível, o que estava sendo posto como a prioridade número um era salvar vidas porque naquele instante 109 países já tinham feito esse contrato.

Como o senhor avalia a proposta de reforma tributária fatiada?

Falei recentemente com o presidente Baleia Rossi, que é o autor da proposta da PEC 45. Ele trouxe um artigo muito incisivo mas muito lúcido e transparente dizendo que, na verdade, o governo federal nunca teve um interesse efetivo de levar esse tema adiante, como teve em relação à reforma da previdência, quando, no momento em que ele se determinou a fazer, foi discutido, e em 7 meses o Congresso votou. Não estou entrando no mérito – eu mesmo votei contra. Na reforma tributária ele não mostra isso. Ele deixa que os problemas aconteçam, que os desencontros ocorram, que uma proposta seja apresentada lá e outra aqui. Isso serve para ganhar tempo. Na verdade, toda mudança da política tributária atual termina a desinteressar ao poder Central, que é quem mais se beneficia desse desastroso sistema tributário que nós temos. 

Pode até ser que amanhã, diante dessas reações de hoje, o ministro Paulo Guedes reveja seu posicionamento e passe a fazer uma defesa mais incisiva. Todas essas mudanças tributárias ao longo desses últimos 30 anos se dão desta forma: mal articulada. Os consumidores finais são os maiores prejudicados.

Hoje a gente teria que ter um visão de se dispor a tributar grandes fortunas, tributar herança, discutir a questão do ICMS no destino ou na origem. Mas você nem vai ter aquilo que era a prioridade, que era simplificar o sistema, nem vai conseguir fazer algo ainda mais importante, que é inverter a realidade em que há um sistema regressivo e não progressivo, sistema termina impondo uma carga tributária no consumo. A população mais humilde, que menos têm sofre tremendamente. Essa mudança não vai ocorrer. Pelo menos eu não guardo melhores expectativas de que ocorra.

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