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Flores do recesso

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Há cerca de dois anos, José Antônio Reguffe, senador do DF, sem partido, procurou Rodrigo Rollemberg, seu aliado, recém-eleito governador do Distrito Federal, para conversar sobre o futuro. Bateram um bom papo e no final ouviu a seguinte pergunta:

-Quantos cargos você quer no governo?

-Nenhum. Quero que você cumpra as promessas de campanha.

O Reguffe é assim. Há quem goste e quem não goste. É como ele age. Ele procura ficar dentro dos limites institucionais. Não vai além. Não reivindica cargos, não indica pessoas, mas cobra as posições políticas e ideológicas de partidos e executivos. Não conheço outro parlamentar que tenha semelhante perfil no parlamento.

Definitivamente, este senador vive em outro planeta, naquele planeta imaginado por Marco Maciel, o pernambucano que tanta falta faz na cena brasileira atual. Ele padece de doença séria. Vive em Brasília, mas está distante da política.

Marco Maciel produziu dezenas de estudos sobre reforma política, tanto na Câmara quanto no Senado. Quem se dispuser a percorrer os arquivos do Congresso vai encontrar o rastro dele naqueles trabalhos. O brasileiro vota mal e vota errado.

As representações estão distorcidas e a eleição proporcional resulta em ainda maiores deformações. Com a possibilidade de haver coligações, a sopa de letras confunde o eleitor, que pensa em votar no PT e acaba ajudando a eleger o pessoal do Maluf em São Paulo. Ou entrega dois milhões de votos ao famoso Enéas que aproveita a onda favorável e elege sua secretária.

Não há fatos concretos durante o recesso. Apenas especulações. Há em Brasília alguma acomodação de partidos. O DEM, o antigo PFL, governou o país junto com o PSDB ao tempo de Fernando Henrique Cardoso. Nos tempos de administração PT perdeu espaço, viu suas bancadas se reduzirem no Congresso e agora reage.

São os primeiros movimentos com os olhos postos na eleição de 2018. Lula quer ser candidato a presidência da República. Muita água ainda vai passar por baixo desta ponte. Mas o PT de hoje é menor do que o de ontem. E os outros partidos querem se reforçar para chegar ao momento do pleito com melhores condições de concorrer e vencer.

Isto tudo acontece no recesso. Mas os partidos precisam produzir a legislação eleitoral que estará em vigor na próxima eleição. O prazo se esgotará no final de setembro. Há muito por ser feito. Em primeiro lugar, a cláusula de barreira. Ela impede o surgimento de pequenos partidos ou das legendas de aluguel.

A ideia é de que o partido só poderá ter representação no Congresso se alcançar determinado percentual de votos em nove estados da União. Se não conseguir, viverá como partido, mas não terá acesso ao fundo partidário, nem terá assento no Congresso Nacional. Com uma tacada dessas, o Congresso ficará entregue a no máximo seis partidos políticos.

Outro ponto importante é proibir as coligações nas eleições proporcionais. O objetivo, neste caso, é dar maior visibilidade ao candidato. O eleitor precisa ter a segurança que está votando na pessoa que o representa. São duas modificações aparentemente simples que possuem a virtude de modificar substancialmente o panorama eleitoral brasileiro.

Boa parte da crise nacional é consequência do sistema eleitoral leniente e desprovido de mecanismos adequados de controle. Qualquer pessoa cria um partido, assim como qualquer grupelho cria um sindicato. Em qualquer dos casos o objetivo é apenas receber verbas federais. E negociar vantagens. Ou seja, o sistema é basicamente corrupto.

A reforma previdenciária é importante, sem dúvida. A tributária, também. Mas a mãe de todas elas é a reforma política. O vírus da corrupção está entranhado neste sistema. É importante modificar essa maneira de eleger o parlamentar, criar partidos mais sólidos, mais ideológicos e menos volúveis.

A discussão sobre a adoção do voto distrital é antiga. Há argumentos a favor e contra. O voto em lista só funciona no regime parlamentarista europeu. No presidencialismo brasileiro ele contribuiria para criar feudos. Teria a virtude de piorar o que já é muito ruim.

Todas essas decisões precisam ser tomadas até o final de setembro. A legislação eleitoral deve ser modificada até um ano antes da realização do pleito. Caso contrário, as modificações entrariam em vigor na eleição seguinte. O recesso serve para colocar outros temas em discussão. A reforma política anda meio esquecida. É tempo de lembrar dela.

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